“Eu sou muito mais que um gamer, sou do entretenimento”, afirma o produtor de conteúdo Leonardo Santi.
Por Guadalupe de Souza Pereira e Maria Fernanda Arival
Assistir outras pessoas jogarem se tornou um entretenimento bastante popular na internet. Milhões de espectadores acompanham plataformas online de transmissão ao vivo de vídeo para ver conteúdos de todos os tipos – shows, entrevistas, viagens e lazer, culinária – mas principalmente para assistir a produtores de conteúdo jogando games.
A plataforma de streaming (em português, transmissão) mais popular é a americana Twitch, que há 6 anos foi adquirida pela gigante de tecnologia Amazon numa negociação que envolveu quase US$1 bilhão. O valor refletia o potencial da plataforma, que em 2015 ostentava 100 milhões de visualizadores mensais. Em janeiro de 2021, a marca foi de 2,84 milhões, segundo o Twitch Tracker.
Relatórios dão conta de um recorde de público no primeiro semestre deste ano, com ganho de 50% em relação ao mesmo período no ano passado. A busca por entretenimento na internet, incentivada pela pandemia de Covid-19, é um fator relevante para este marco. Porém a líder de mercado de streaming tem passado por um mal estar com seus usuários.
Com a chegada de novos streamers para dividir o espaço aumentaram os obstáculos que a plataforma têm colocado em relação à entrega das transmissões aos usuários e inscritos dos pequenos e médios criadores de conteúdo. A reação dos streamers tem se intensificado.
Leonardo Santi conta que desde a época que trabalhava apenas com o YouTube, as amizades com outras pessoas desse ramo surgiram e se fortaleceram. Com o tempo, chegou na Twitch, onde é conhecido como LeoSantiLive. “Desde minha mudança de conteúdo no YouTube eu tinha um desejo de uma interação maior e já tinha essa vontade desde que conheci esses meus amigos. Eles sempre me influenciaram e colocaram muita ‘pilha’ para eu fazer [live]. Então, eu fiz”.
Santi possui um perfil com aproximadamente 40 mil seguidores na plataforma de streaming e faz, em média, cinco transmissões por semana desde abril de 2020, no início da pandemia, com jogos independentes, de história e mais casuais, para se divertir.
Leonardo Santi, conhecido como LeoSantiLive. Reprodução/Instagram
“Eu faço qualquer coisa que eu ache que vai ser divertido. Simplesmente sento, sem ser pro player [jogador profissional], só me divirto. Os jogos que eu menos jogo são os da categoria E-sports, porque eu sou muito mais que um gamer, sou do entretenimento”.
De acordo com o streamer, os amigos que também fazem parte dessa comunidade auxiliam na divulgação das transmissões, por serem criadores de conteúdo com muitos seguidores. “Eu acabei tendo um pouco de ‘sorte’, então acabo tendo uma divulgação por tabela”.
Leo Santi e Rafael Guaxinim, o Guaxinim na Twitch, que atualmente possui 483,1 mil inscritos na plataforma. Os dois participaram juntos da Spoiler Night da Comic Con Experience 2019, em São Paulo.
Por outro lado, Nathan Christian, o MeninoNeitam na Twitch, conta que tem amigos que o ajudam, mas que já passou por situações inconvenientes com outros streamers. “Ao mesmo tempo que uma grande parte tenta ser seu amigo para te derrubar, roubar os contatos, tirar proveito para ser notado ou até mesmo roubar subs [assinaturas no canal], uma minoria não é assim. É preciso tomar cuidado. Os que tenho de amizade já me ajudaram muito nesse ramo, por exemplo o The Darkeness, que fez meu chat bombar com duas mil pessoas. O Chico BR já me ajudou com equipamento e o Bobbyzeira foi um grande conselheiro. Tenho também total admiração por eles”, afirma.
Nathan começou no YouTube em meados de 2015, com ajuda do pai, que sempre apoiou o avanço do canal, e também migrou para a plataforma de streaming em busca de interatividade maior com as pessoas que o acompanham. Atualmente, as lives acontecem de segunda a sexta-feira, às 21h, com jogos de lançamento, clássicos e de qualquer plataforma, com apoio de desenvolvedoras como Nintendo, Xbox e PlayStation, além de outras empresas nacionais.
Nathan com produtos da Nvidia GeForce, empresa multinacional de tecnologia. Foto: Arquivo Pessoal.
“Eu decidi me dedicar [às lives] mais pela interação, porque fazer live é uma coisa dinâmica. Você puxar os seguidores para o seu canal é uma forma de divulgar mais o seu canal para outras pessoas. Só que nesse tempo é mais difícil, todo mundo quer fazer live, então, realmente não é uma coisa que é fácil hoje em dia. Todo mundo está fazendo live”, explica Nathan.
Problemas com a plataforma
Após mudanças na política de preços, produtores de conteúdo de pequeno e médio porte passaram a se queixar da plataforma Twitch. Esses usuários monetizam seus canais, isto é, convertem assinaturas e os anúncios do site em renda. O valor tradicional de assinatura, chamada de sub, teve uma redução de 66% – tornando mais acessível ao espectador a adesão de conteúdos exclusivos de um canal, mas afetando drasticamente a renda dos streamers.
De acordo com Nathan, na pandemia o número de pessoas fazendo live aumentou e as plataformas têm usado novos algoritmos. Como o exemplo da Twitch, que mudou a forma de monetização e tem prejudicado pequenos e médios criadores de conteúdo. Além disso, a plataforma também mudou a forma de entrega das transmissões aos usuários.
“Eu fui prejudicado em uma grande proporção, porque o pagamento que eu recebia a cada mês ou a cada dois meses, agora vai demorar de cinco a seis meses para eu receber. É muito preocupante. Hoje eu tenho 4 mil seguidores, mas a Twitch não entrega as lives para essas 4 mil pessoas. Minha média caiu bastante, mas eu continuo na luta e não me intimido com isso. Mas é uma coisa que realmente a Twitch tem que rever”, afirma Nathan.
Publicações no Twitter repercutem reivindicações e reclamações em relação à política de preços da plataforma de streaming. Uma greve foi nomeada de Apagão da Twitch.
Em resposta, usuários da Twitch se organizaram nas redes sociais para promover uma greve reivindicando a revisão na política de preços do site. Paralelamente, streamers dos Estados Unidos também organizaram um boicote em reação a ataques de ódio de espectadores durante as transmissões – que se iniciou com a hashtag Twitch do Better, a favor de uma plataforma com menos assédio.
Casos de ataque de trolls foram relatados no jornal The Washington Post e deixam claro que grupos racistas se reúnem para constranger e ofender produtores de conteúdo negros. Com a organização do boicote nos EUA para o dia 1º de setembro, os brasileiros aproveitaram para juntar as pautas e organizar outro apagão no mesmo dia.
Publicação no Twitter que anuncia o 2º apagão na plataforma
Como resultado, dados da Gamesight Analytics confirmaram uma queda de quase 1 milhão de horas assistidas e uma diminuição de 14 mil canais ativos na plataforma de streaming americana só no segundo apagão. Dias antes, a Twitch se posicionou em apoio às manifestações e prometeu que continuaria “a trabalhar para fazer da Twitch o melhor serviço para os criadores de conteúdo criarem e promoverem suas comunidades”.
De acordo com Leonardo, a remuneração das lives ainda não é muito grande, mas ele usa o espaço para divulgar e impulsionar o YouTube e o Instagram, onde faz trabalhos com “publis” – publicidade de marcas parceiras – em posts e stories. “A gente tira um dinheiro com as lives, mas usa para divulgar nosso ‘trampo’. A gente usa como ferramenta para trabalhar com internet, porque é muito difícil ter alguém que trabalhe só com o YouTube ou só com as lives”, ressalta.
Leonardo, o LeoSantiLive, exibe “recebidos” de empresa parceira. Foto: Reprodução/Instagram
Já Nathan é funcionário de uma grande empresa americana e afirma não abandonar por nada, uma vez que gosta do trabalho e tem apoio para continuar na criação de conteúdo pelos chefes e supervisores. “Eles sabem e apoiam também. É a melhor empresa que eu já trabalhei na minha vida e recentemente fui promovido. Faço as lives por diversão também como uma renda extra. No momento não me vejo só trabalhando com lives, consigo conciliar as duas coisas”, conta.
Nathan, ou, como é conhecido na internet, MeninoNeitam. Foto: Arquivo Pessoal.
Ao manter viva a culinária típica do Acre, cozinheiro conquista turistas e moradores com sua famosa rabada no tucupi.
No Mercado do Bosque, um prato típico do Acre ganhou status de tradição: a rabada. Preparada há mais de três décadas por Antônio Felinto Alves,, eleviu seu nome atrelado à rabada, além de ser também o Toinho do Tacacá.
A iguaria se tornou referência gastronômica para acreanos e turistas. Seu Antônio iniciou sua trajetória aprendendo com Dora, uma cozinheira tradicional também muito conhecida pelos acreanos. Com o tempo, decidiu seguir carreira solo e consolidar seu próprio negócio. Hoje, acumula 35 anos de experiência e 18 certificados na área gastronômica.
“Quanto mais a gente se aprofunda nos temperos, no jeito de preparar, melhor fica. O segredo da rabada perfeita é cozinhar com carinho e amor, não apenas vender por vender”, afirma. Mesmo com décadas de tradição, Toinho também se adaptou às modernidades. O iFood tornou-se parte fundamental do negócio. “Nos tempos de friagem, chegamos a 90 ou 100 pedidos por dia. Nosso ponto forte é no aplicativo”, explica.
A fama atravessa fronteiras. Segundo ele, os turistas que chegam ao Acre procuram diretamente por seus pratos. “O pessoal, quando vem aqui, me fala que vai levar rabada para Brasília, Goiânia, Santa Catarina. Nosso sabor viaja junto com eles”, relata com orgulho.
Para o comerciante, o segredo do sucesso é manter a fé e a dedicação:“Quando o pessoal diz que está ruim, eu não concordo. Se você tem saúde e acorda enxergando, já é motivo para agradecer a Deus. O resto a gente corre atrás.”
A dor em palavra: Gabe Alódio prepara “A Casa de Vidro”
Após a estreia visceral com Fogo em Minha Pele, autora acreana lança novo romance que mistura silêncio, fragilidade e arquitetura emocional. Foto: Rafaela Rodrigues
O segundo livro de um autor, na maioria dos casos, revela muito mais do que o primeiro.
Se a estreia é a urgência de se apresentar ao mundo, a obra seguinte já nasce sob a consciência de que o público, e a própria autora, esperam algo. É nesse momento que Gabe L. Alódio, escritora acreana de 29 anos, se encontra com “A Casa de Vidro”, romance que será lançado em setembro e lançado em Rio Branco no dia 16 de outubro, às 19h, no Cine Teatro Recreio.
O título não é literal. Trata-se de uma metáfora clara, assumida pela autora, para a fragilidade e a exposição do ego. A casa é moderna, cercada por vidro, mas cada detalhe arquitetônico foi mentalmente desenhado antes da primeira frase. Ela descreve: “Sei onde a luz atravessa os cômodos, onde a vista se abre e onde qualquer pedra provocaria a primeira rachadura. Vejo a Casa de Vidro como uma metáfora para a própria escrita, transparente na linguagem, mas vulnerável na exposição dos temas abordados”.
Da intensidade ao silêncio
Em Fogo em Minha Pele (2024), livro de estreia, Gabe apresentou uma poesia narrativa marcada pela intensidade física e emocional, algo que remete à lírica confessional e a um certo intimismo da tradição modernista.
Já em A Casa de Vidro, essa energia se desloca para o silêncio e para a construção de atmosfera. A autora se aproxima de estratégias de escritores como Marguerite Duras ou Joan Didion, que sabem que a ausência pode ser mais expressiva que a presença.
A protagonista, Sophia, vive isolada com o marido numa casa que funciona como personagem. A narrativa gira em torno da tensão entre manter e perder o controle. Como descreve a própria Gabe, é como equilibrar crises carregando uma bandeja cheia de xícaras empilhadas.
Publicado em 2024, Fogo em Minha Pele apresentou a escrita visceral e confessional de Gabe, marcada por desejo, corpo e memória. Foto: divulgação
Referências cruzadas
O material visual que a autora preparou para orientar a capa é revelador. A arquitetura modernista da Casa Samambaia, de Lota de Macedo Soares, convive com as aranhas de Louise Bourgeois, símbolos de criação e aprisionamento. Há também Maria Callas, figura que sintetiza glória e abandono, e a presença de Dionísio, que remete à ligação entre vinho, prazer e destruição. É uma curadoria imagética que mostra a amplitude de referências da autora, em diálogo com artes visuais, música e mitologia.
Entre o fogo e o vidro
Se o primeiro livro era fogo, ardente e direto, marcado por desejo e paixão, o segundo é vidro: calculado, transparente, mas pronto para quebrar e cortar fundo. Essa mudança revela maturidade narrativa, sem perder a visceralidade que caracteriza a autora.
O desafio agora será ver como A Casa de Vidro dialoga com o leitor. Como diz Gabe: ˜Escrever é fácil, viver é difícil”. Talvez este novo livro seja justamente um gesto de habitar esse difícil, transformando-o mais uma vez em palavra.
A cada segunda-feira, o campus da Universidade Federal do Acre (Ufac) vira palco para a Batalha da Ufac. Criada por um grupo de idealizadores da cena local, entre eles o estudante de Psicologia Davi Nogueira, a batalha é um espaço aberto para jovens expressarem suas histórias e críticas sociais por meio do rap.
O formato das batalhas de rap no Brasil surgiu no início dos anos 2000, inspirado por movimentos internacionais, e se consolidou em grandes centros como Rio de Janeiro e São Paulo.
Em Rio Branco, os eventos vem ganhando força desde a Batalha do Palácio, considerada a mais antiga da cidade, que era realizada às sextas-feiras na praça do Palácio Rio Branco.
Hoje o cenário local conta com eventos como a Batalha da Pista, do Santa Cruz e, principalmente, a Batalha da Ufac, que acontece no Teatro de Arena, conhecido como Coliseu, ao lado do Centro de Convivência.
Davi Nogueira destaca que o objetivo da batalha na universidade é democratizar o acesso à arte e trazer a comunidade para dentro do campus.
“Muita gente achava que não podia entrar aqui. O Coliseu da Ufac é o lugar ideal, com estrutura e visibilidade para um evento cultural”, explica.
Para os participantes, o evento é muito mais que uma disputa de rimas. Apache Shaft, MC que frequenta a batalha, conta que o encontro representa um espaço seguro para trocar experiências, fazer amizades e fortalecer a cultura local. “É meu abrigo nas segundas-feiras. Quanto mais rap, mais cultura, menos crime”, afirma.
Entre o público, o humorista e influenciador Rafael Barbosa valoriza o clima acolhedor da batalha e ressalta a necessidade de maior apoio para o evento crescer. “Aqui tem muita poesia e sentimento, mas faltam som adequado e divulgação do poder público”, sugere.
Momento em que os artistas fazem as batalhas. Foto: Felipe Salgado
Mais do que um show de talentos, a Batalha da Ufac é um importante instrumento de transformação social. Ao abrir as portas da universidade para a periferia, o evento reforça a ideia de que a cultura hip hop pode mudar vidas e fortalecer a autoestima de jovens, muitas vezes marginalizados.
Realizada de forma independente, a batalha conta com apoios voluntários e busca parceiros para ampliar sua estrutura. Na primeira edição, o evento lotou o Coliseu e conquistou mais de mil seguidores nas redes sociais antes mesmo de acontecer: um marco para o rap acreano.