Histórias de vida
Marcas Que Nunca Vão Passar

Publicado há
3 anos atrásem
por
Redação
Por Renato Menezes

(Alerta de gatilho: este texto aborda abuso sexual)
Era 30 de abril de 2011, às 17h48, quando a vida de Ariane* virou de cabeça para baixo, de uma forma que ela jamais imaginou que aconteceria em toda a sua existência. Acompanhada de sua filha mais velha, Sofia*, então com 6 anos de idade, ela chegou à Delegacia Especializada em Crimes Contra à Mulher, localizada no 2º distrito de Rio Branco (AC), para fazer uma denúncia. “Ele mexeu com a minha filha”, disse aos prantos para o delegado que a recebeu, acusando o padrasto da menina como o principal responsável.
…
Ariane conheceu seu cônjuge em meados de 2006 e engataram um relacionamento. No final do ano, ela descobriu que estava grávida de sua segunda filha, Luana*, que acabou nascendo um dia antes de seu aniversário de 22 anos. A mais nova integrante da família fez com que ela fosse morar com ele na casa da sogra, acompanhada da filha mais velha, Sofia, fruto de um relacionamento com seu primo, que acabou não prosperando.
Depois de um tempo, cansada de passar por humilhações e enfrentar maus olhares da sogra, os quatro resolveram morar de aluguel em um quarteirão localizado em um bairro vizinho. Lá, eles viviam uma vida humilde, mas aparentemente harmoniosa. Bom, pelo menos até o momento em que o então marido começou a humilhar e a bater em Ariane pelo menor “motivo” que fosse, desde ciúmes banais até à janta não feita. Eram socos, tapas na cara e até cárcere privado por alguns dias ela enfrentou, proibindo-a de ir à casa dos pais. Entre idas-e-voltas que, tristemente, costumam ser comuns em relacionamentos abusivos, eles ficaram sem condições de custear o aluguel e passaram a morar em um pequeno apartamento nos fundos da casa dos pais de Ariane.
Passado um tempo, ela arrumou um emprego em uma loja de presentes e decoração, onde às vezes trabalhava até mais que o permitido por lei, porque acreditava que, fazendo isso, dificilmente perderia o trabalho que necessitava tanto. A vida passou a ser muito corrida, era das 13h às 22h trabalhando, enquanto achava que as filhas estavam sendo bem cuidadas pelo padrasto e pai.
No entanto, depois que Ariane passou a ficar mais tempo fora de casa, começou a perceber que estava acontecendo algo de estranho com a filha mais velha. Achando que era coisa de criança, acabou acreditando ser um comportamento típico para a idade de Sofia. Só que em meados de dezembro de 2010, ao chegar do trabalho, viu que a situação estava além do tolerável. “Quando eu cheguei do trabalho, tarde da noite, ela estava deitada na cama, sozinha, coberta e assim que ela ouviu minha voz, me abraçou profundamente. E eu não entendia o porquê daquilo”, falou.
E esse estranhamento não foi percebido apenas por Ariane. A avó de Sofia também começou a ficar com “uma pulga atrás da orelha”, pois era acostumada a ver a neta brincando com as outras crianças e, de repente, tinha perdido o ânimo. “Eu falava pra ela: minha filha, o que é que tá acontecendo? Por que você não quer ir brincar com os meninos? E ela só falava que não queria”, disse a avó, que disse nunca ter desconfiado de absolutamente nada, mesmo achando estranho.
No dia 30 de abril de 2011, Sofia reclamou de dor ao fazer xixi. Por conta disso, urinou na roupa duas vezes. “Coração de mãe sente muito. Eu senti que tinha alguma coisa de errado, minha mãe me falando que estava achando estranho o jeito dela, às vezes chorando pelos cantos. Mas eu não sabia, não sabia mesmo. Eu perguntava o que estava acontecendo e ela não me falava, só chorava. Ela só dizia ‘mãe, minha baratinha tá doendo’. Quando eu tirei a roupa dela para ver, (a vagina) estava cheia de bolha e eu achei que era algo relacionado ao xixi”.
Naquele exato momento, ela arrumou a filha e foi até à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Tucumã. No entanto, a UPA estava sem Pediatra, o que a fez ser transferida para o Pronto Socorro de Rio Branco às 12h46, de acordo com o prontuário clínico. Ao relatar o que tinha visto na vagina da filha, até então sem entender nada, logo foi encaminhada para a ala de emergência pediátrica, onde uma equipe de profissionais lhe fez uma enxurrada de perguntas. “No decorrer disso tudo, eles deduziram que era Herpes genital, uma infecção sexualmente transmissível”. Naquele momento, todas as peças do quebra-cabeça tinham se encaixado e a ficha estava começando a cair. O comportamento estranho da filha, a raiva que ela tinha do padrasto, os abraços de medo… Então, ela perguntou para a filha se alguém tinha acariciado as partes íntimas dela.
…
Com base nos questionamentos feitos a Ariane, a equipe pediátrica colocou a criança como suspeita de ter sido abusada sexualmente pelo padrasto há alguns meses, solicitou exame de sorologia para Herpes, atendimento com assistente social e encaminharam-nas imediatamente à Delegacia da Mulher, onde registraram a denúncia. A partir do depoimento de Sofia, que falou que ele chegou a colocar o dedo em suas partes íntimas umas três vezes, mostrou filmes pornográficos e as partes íntimas dele para ela, solicitaram exames de conjunção carnal, bem como testes laboratoriais de HIV/Aids, Hepatites A, B e C e outros.
“Esse dia foi um dia de inferno na minha vida”, disse Ariane.
…
Diante de toda aquela situação que enfrentava junto com a filha, ela se viu em um poço de tristeza, ódio e impotência, tanto por ter confiado demais no ex-cônjuge, como por não ter protegido sua filha como gostaria. Ariane trabalhava demais para colocar o sustento na mesa. Era uma rotina intensa ganhando pouco, saindo ao meio-dia e voltando às 22h e achando que as filhas estavam sendo bem cuidadas. “Eu nunca me senti tão suja na vida. Quando eu me vi dentro de toda essa situação eu pensei em tanta besteira…”
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Em meio às idas à assistente social, psicóloga, maternidade e laboratórios, o único exame que deu positivo foi para Herpes. “Graças a Deus, ele não chegou a introduzir nada na minha filha, não chegou a tirar a virgindade dela, mas para a Justiça, aquilo (o exame) não era prova concreta de que a minha filha tinha sido molestada”.
De acordo com o relatório sentencial, Ariane chegou a contar em um dos depoimentos à Justiça que havia aparecido umas marcas semelhantes às da vagina na bochecha de Sofia aos seis meses de idade, o que acabou tendo grande influência nos autos judiciais. Contudo, ela afirmou para o processo e para essa entrevista que aquilo tinha sido uma reação alérgica desencadeada a partir de um beijo que a avó paterna tinha dado nela. “Onde ela beijou, ficou a marca do batom ‘meio vinho’ que ela usava, e foi onde deu uma alergia, devido à pele de recém-nascido ser muito sensível. Na época eu levei a Sofia no hospital, não me falaram nada de Herpes. Eu não tinha por quê inventar uma coisa dessas agora”.
Ariane disse que o acusado não fez exame para Herpes e que não acredita que a filha contraiu o vírus antes dos abusos, porque as bolhas foram notadas depois que Sofia mudou o comportamento e passou a ficar mais retraída. “Minha filha era uma criança, ela não ia contar uma história horrível dessas do nada, ninguém da minha família nunca passou por isso”. De acordo com ela, o réu não chegou a fazer o exame justamente porque colocaram em alto grau de relevância o ocorrido com a menina aos seis meses.
…
A sentença foi dada no dia 17 de outubro de 2013 e inocentou o ex-marido, embasada no argumento de que a palavra da vítima, apesar de sempre se sobressair à do réu, não era clara o bastante. A pouca idade de Sofia na época justificava o nervosismo da vítima no depoimento judicial. O advogado do acusado também alegou que a criança podia ter contraído Herpes na escola, que é uma doença muito comum e de fácil transmissão.
“Como não tinham provas mais firmes de que ele havia introduzido alguma coisa na vagina da minha filha, eles acabaram arquivando o caso. O que eles queriam era um exame carnal, algo mais concreto. E a gente não tinha mais nada o que fazer porque ela foi ouvida, e eles talvez pensaram que era coisa de criança, algo do tipo. Isso me revolta muito até hoje, porque ele ficou como o inocente na história”, desabafou Ariane. Ela acredita que o estupro propriamente dito não aconteceu porque moravam, praticamente, na mesma casa de seus pais, e corria o risco de Sofia fazer algum escândalo e todo mundo acabar escutando.
Ariane tem certeza que de inocente ele não tem nada. Primeiro, porque ela jamais vai duvidar da palavra da filha frente a um homem que já bateu, xingou e a maltratou em diversas ocasiões. Segundo, porque ele fugiu para a casa da mãe assim que soube que elas tinham ido ao hospital por tal motivo.
“Quando eu acompanhei a Ariane na UPA e depois, no Pronto Socorro, os médicos que viram a situação não deixaram a gente sair de lá até que chegasse a assistência social, porque já imaginavam o que era. Se eu não me engano, minha outra irmã, na tentativa de não piorar a situação mais do que já tava, ligou escondida para ele e disse para ele sumir de lá (apartamento onde moravam nos fundos da casa dos pais de Ariane), pois se essa história chegasse primeiro nos ouvidos do meu pai, ele seria capaz de matá-lo com o terçado que tinha”, disse a irmã de Ariane, complementando que hoje enxerga a ligação como um livramento de Deus, pois tinha certeza que iria acontecer uma tragédia muito maior, com gente morta e presa. “Meu pai é um homem trabalhador, muito simples e batalhador desde sempre. Ele não merecia sujar as mãos dele com o sangue de um *&%$# (palavrão)”.
O acusado, após a sentença, ainda passou os anos subsequentes perseguindo e rodeando a família, inclusive gerando vários processos: pedido de guarda da filha biológica, baixa no valor da pensão, acusação de calúnia e difamação por parte do pai de Ariane, que acabou se alterando em várias discussões e xingou-o de palavras de baixo calão ao vê-lo parado em frente à sua residência.
“A gente tinha uma medida protetiva que impedia ele de circular por perto da nossa casa. Mesmo assim desrespeitava, porque queria ver a filha nos dias que não eram os dele, mas eu não deixava de jeito nenhum. Ele até hoje nunca pagou pensão para a Luana, mesmo eu tendo ido na justiça diversas vezes. Parece que ele tinha prazer de desestabilizar a gente”, irrita-se Ariane.
…
Ao relembrar toda a situação caótica, Ariane diz que se revolta até hoje com o arquivamento do processo, pois ficou parecendo que ela e a filha estavam mentindo.
Ela contou que é impossível esquecer o que ela e as filhas passaram com tão pouca idade. “Em uma das inúmeras discussões, tempos depois da sentença, ele olhou para mim e esbravejou, com um ódio enorme, que eu nunca mais ia ser feliz na minha vida. Claro que eu não internalizo isso, mas às vezes quando eu estou muito triste, fico realmente pensativa se ele jogou alguma praga em mim”.
Atualmente, ela continua com a guarda de suas duas meninas em sua casa própria e disse que desde meados de 2019 ele não procurou mais pela filha biológica. “E eu espero que continue assim pro resto da vida. Graças a Deus minha filha não sente nenhum pingo de falta dele e não faz mais questão de manter o mínimo de contato”. Hoje, Luana tem 13 anos.
Sobre Sofia, que está com 17 anos, Ariane disse que hoje ela é bem mais aberta para falar sobre as coisas, mas que ainda tem prejuízos psicológicos e gatilhos pessoais disso tudo. “Hoje ela é uma pessoa totalmente diferente, mas claro que com algumas sequelas. Quando ela fica muito calada, eu já fico muito preocupada e já sento para conversar… são marcas que eu sei que nunca vão passar”.
Se você conhece ou sabe de alguma criança ou adolescente que está enfrentando situações de abuso ou exploração sexual, não hesite em denunciar ligando para o 180. A ligação é gratuita, anônima, sigilosa e você pode contribuir para que estas vítimas sejam assistidas e os envolvidos, devidamente responsabilizados.
*Nomes fictícios para preservar a identidade das vítimas
Obs.: O nome da pessoa que foi acusada não é citado pois a lei o julgou como inocente e o processo foi arquivado por falta de provas contundentes.

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Mulheres que fazem acontecer: a força do trabalho manual no empreendedorismo acreano
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Publicado há
4 semanas atrásem
5 de junho de 2025por
Redação
Por Thaynar Moura
Elas não apenas produzem: elas plantam, moldam, carregam, vendem e resistem. Em um cenário onde empreender não é só uma escolha, mas uma forma de sobrevivência, mulheres do Acre estão transformando o que têm — terra, cimento, fruta, memória — em renda, autonomia e permanência. Muitas fazem isso com as próprias mãos. Outras, com apoio da família. Mas todas compartilham algo em comum: a decisão de permanecer criando.
Da colheita ao pote: Lucilene e a trajetória de um doce feito com raízes
Lucilene Nonata, de 58 anos, vive com o marido em um sítio no interior do Acre. Foi ali que, há cerca de duas décadas, ela decidiu começar a fazer doces com frutas do próprio quintal. “Meus filhos estavam entrando na adolescência e eu queria fazer algo meu, que também ajudasse na renda da casa”, conta.
A escolha pelo doce não foi aleatória: os pais de Lucilene já faziam compotas com frutas temporãs, e o marido, cearense, também gostava de preparar receitas simples. “Foi natural. Começamos com o que a gente tinha: cupuaçu, mamão, banana. O leite vinha do vizinho.”
Hoje, mesmo com o pomar envelhecido e parte da matéria-prima comprada de produtores vizinhos, o processo segue artesanal. Tudo é feito por Lucilene e o esposo, desde a limpeza até o ponto do doce. A venda acontece em feiras e comércios locais, e o contato com o público é parte do valor do produto. “As pessoas perguntam se é a gente mesmo que faz. Criamos laços. Muitos viram amigos.”
A formalização veio com apoio do Sebrae, que orientou desde o registro como MEI até a criação dos rótulos e da tabela nutricional. “O Sebrae foi nosso primeiro e melhor parceiro. Nos abriu portas e deu acesso a linhas de crédito, cursos e assistência técnica”, relata.

Apesar dos avanços, o desafio é constante: o alto custo dos insumos e a concorrência com produtos industrializados. “É difícil competir. Nosso estado não é rico. Mas a gente vai atravessar essa fase também”, afirma Lucilene. E para outras mulheres que pensam em empreender, ela é direta: “Somos guerreiras. Se cada dia traz um leão, que venham os leões.”
Concreto, família e criação: a arte que resiste com Elizabete e Maria Eliane
Elizabete Monteiro tem 25 anos e voltou ao Acre em 2025, depois de concluir a graduação em Curitiba. Junto com a mãe, Maria Eliane, de 61, criou o negócio “Arte em Concreto”, voltado à produção manual de peças decorativas feitas a partir de cimento, areia, pedrita e moldes reaproveitados.
“O gosto pelo artesanal sempre veio da minha mãe. Quando ela ia passar um tempo comigo, ficava procurando o que fazer com as mãos”, lembra Elizabete. A dupla começou estudando técnicas no YouTube e fazendo testes em casa, até descobrir formas de agregar valor às peças — como a inclusão de plantas e o uso criativo do concreto na decoração.
O trabalho é familiar. Elizabete e a mãe cuidam da produção. O pai ajuda nas feiras. A irmã apoia na divulgação digital. “É algo muito em família, e cada um colabora do seu jeito”, afirma.
Entre os maiores desafios, Elizabete destaca o início do processo. “É preciso vencer o medo de começar. Mostrar o que você faz e lidar com o marketing exige constância.”Atualmente, participa da associação “Elas Fazem Acontecer”, formada por mulheres empreendedoras que organizam feiras e dão suporte às expositoras. “Faz diferença. A gente se sente parte de algo.”
A empresa começou a vender peças há cerca de um mês, e uma das metas de Elizabete é investir mais na divulgação pelo Instagram. “Hoje, se você quer saber de algo de uma loja, já vai direto no Instagram. Quero turbinar as postagens.”
Para ela, o mercado de decoração artesanal está crescendo. “As pessoas querem peças com identidade, que sejam únicas.” E para outras mulheres que sonham empreender: “Persistam. Se você ama o que faz, o retorno vem. Mas é preciso estar atenta às novidades e criar com propósito.”
Arte, dedicação e persistência: de uma conversa entre amigas ao ateliê em casa – o sonho de Adriana
Adriana Balica, 32 anos, é proprietária da FazerArt Personalizados, um ateliê montado na própria casa, onde ela cuida de tudo: do atendimento à criação das artes e à embalagem personalizada. “A FazerArt nasceu numa conversa entre amigas, juntando minha paixão pelo trabalho manual. Hoje, faço tudo sozinha,” conta.
Para Adriana, empreender é uma jornada que exige atenção constante. “Empreender é uma tarefa extremamente difícil, pois temos que dominar um pouquinho de cada coisa e estar sempre atenta a todos os detalhes. Há dias e dias, há altos e baixos, assim como a nossa vida”, reflete.

Assim como as outras mulheres desta reportagem, Balica destaca o apoio do Sebrae. “O Sebrae sempre esteve de portas abertas pra ajudar, tirar dúvidas, oferecer cursos, palestras e concursos. Sempre que posso, participo.”
E sobre tecnologia? Ela brinca: “Não uso nenhuma tecnologia avançada, eu acho, kkk.”
Para quem pensa em empreender, Adriana tem um conselho: “Lute! Lute pelos seus sonhos. Deus não coloca sonho no nosso coração que a gente não possa alcançar. É difícil, cansativo, cheio de desafios, mas vale a pena! ”
Onde termina o produto, começa a história
As histórias de Lucilene, Elizabete e Adriana, não são exceções. Elas representam milhares de mulheres no Brasil e no Acre que vivem daquilo que fazem, cultivam ou aprendem. Os dados mais recentes reforçam o que as histórias contam: empreender, para muitas mulheres, é uma decisão moldada pela necessidade, mas sustentada pela criatividade e pelo trabalho diário. Que trabalham com o corpo, com a memória e com o tempo.
No Acre, o número de mulheres à frente de negócios oscilou nos últimos três anos. Segundo dados do DataSebrae, em 2022, eram 23.564 empreendedoras no estado. Em 2023, esse número caiu para 20.453, representando 23,7% do total de donos de negócios. No entanto, em 2024, houve uma leve recuperação: 21.350 mulheres atuavam como donas de negócio no estado no 4º trimestre, o que representa 25,1% dos empreendedores locais.

Esse avanço percentual, frente aos 23,7% registrados no ano anterior, revela uma retomada gradual da presença feminina no mercado.
Em números nacionais, 42% dos empregadores ou trabalhadoras por conta própria no Brasil são mulheres — um universo de 10,4 milhões de empreendedoras que movimentam a economia com pequenos negócios, muitas vezes construídos no quintal, na sala de casa ou em uma feira.
O aumento na participação percentual indica que as mulheres seguem ocupando espaço, criando soluções e sustentando seus negócios com o que têm – seja terra, concreto ou papel.
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Excomungado: quando a música acontece apesar de tudo
Em uma cidade onde a cultura muitas vezes é negligenciada, a Excomungado surgiu. Uma banda composta por músicos de nascença, jovens e com muita vontade de fazer um som. Formada por Carlos “Carlinhos” Hofre, Ícaro Moreira, Roberto “Bala” Padula e Lucas Alefe, a banda é mais do que um grupo de músicos, é um coletivo de amigos que transformou a paixão pela música em um projeto autoral, cheio de personalidade e força. De shows por diversão até planos ambiciosos para o futuro, a Excomungado traz consigo a prova de que o que falta na cultura do Acre é investimento.

Publicado há
3 meses atrásem
1 de abril de 2025por
Redação
Por Gabriel Vitorino e Fernanda Maia
Em uma cidade onde a cultura muitas vezes é negligenciada, a Excomungado surgiu. Uma banda composta por músicos de nascença, jovens e com muita vontade de fazer um som. Formada por Carlos “Carlinhos” Hofre, Ícaro Moreira, Roberto “Bala” Padula e Lucas Alefe, a banda é mais do que um grupo de músicos, é um coletivo de amigos que transformou a paixão pela música em um projeto autoral, cheio de personalidade e força. De shows por diversão até planos ambiciosos para o futuro, a Excomungado traz consigo a prova de que o que falta na cultura do Acre é investimento.
A história da Excomungado começa com as trajetórias individuais de seus integrantes que, desde cedo, estiveram imersos no mundo da música. Carlinhos, o compositor e vocalista, começou a tocar violão aos 8 anos, aprendendo com o avô. Sua paixão pela música só cresceu após aulas com o renomado Geraldo Aquino, popularmente conhecido como Mestre Geraldinho, que ele descreve como um “gênio do violão”. Apesar de sua timidez em assumir o papel de frontman, Carlinhos é a alma criativa da banda, responsável pelas letras e melodias que definem o som da Excomungado.

Já Ícaro, o baixista da banda, começou no violão aos 13 anos, aprendendo com o ex-cunhado, que é formado em música. Mais tarde, migrou para o baixo e conheceu o resto dos integrantes, assim acabou entrando para a Excomungado. Além da banda principal, Ícaro participa de vários projetos paralelos, incluindo covers de Radiohead, com a banda Superflat, e Terno Rei em um projeto entre amigos programado para ocorrer no dia 18 de abril, às 21h, no Studio Beer.
Bala, o baterista, cresceu em meio ao som de instrumentos. Filho de músico, ele começou a tocar bateria quase que por acidente, quando sobrou o instrumento após um ensaio da banda do pai, ele e os amigos decidiram tocar e, de acordo com ele, “a bateria foi o que sobrou”, disse rindo. Desde então, já passou por mais de 15 bandas, incluindo a Nickles, onde toca baixo. Sua experiência no cenário musical em Rio Branco e na música em si agregam muito ao desenvolvimento da Excomungado no cenário.
Por fim, Lucas, o guitarrista, começou na bateria aos 9 anos, mas foi com a guitarra do pai que ele realmente se encontrou. Autodidata, aprendeu a tocar sozinho, desenvolvendo um estilo único que hoje é uma das marcas da banda. Sua abordagem livre e cheia de personalidade traz uma sonoridade autêntica para a Excomungado.
O Nascimento da Excomungado
A banda surgiu em 2019, em meio do caos da pandemia, quando Carlinhos, então com 14 anos, decidiu transformar suas composições em um projeto coletivo. Ele convidou Lucas, que já tocava na banda Selfless, focada em músicas do rock grunge, e juntos formaram a primeira formação da Excomungado, com Pedro na bateria, Mika no baixo e Isa no vocal. O primeiro show foi em um sarau na Ufac, um evento de artes cênicas, onde tocaram ao lado de outros artistas locais.

Desde então, a Excomungado cresceu e se consolidou como uma das principais atrações do cenário underground de Rio Branco. O nome da banda, que surgiu como uma brincadeira, ganhou significado ao longo do tempo, representando a resistência e a autenticidade de um grupo que não se encaixa nos moldes tradicionais da música no Acre.
A Excomungado é um reflexo da realidade da cena musical de Rio Branco, onde os desafios são muitos, mas a paixão pela música é maior ainda. A falta de investimento em cultura, a escassez de espaços para shows e a dificuldade em conseguir editais são obstáculos constantes. “Aqui em Rio Branco, as bandas não têm investimento, nem lugar para tocar”, desabafam todos os membros, tanto como banda, quanto como músicos em busca de um espaço.
Apesar das limitações, a banda não se deixa abater. Eles já gravaram várias músicas em casa, usando equipamentos simples e muita criatividade. “A gente gravou no quintal, com uma pedaleira, um PC de 4 GB de RAM e microfones baratos”, conta Ícaro. A falta de recursos não impede a qualidade, as músicas da Excomungado são autênticas e cheias de personalidade, mostrando que a música autoral acontece independente das condições precárias.
A Excomungado não quer ficar restrita às garagens de Rio Branco. O principal objetivo da banda é conseguir um edital para gravar um álbum autoral, reunindo músicas antigas e novas. Eles já têm o projeto na cabeça, mas falta o recurso financeiro para colocá-lo em prática. “O objetivo é gravar, viajar e divulgar nosso trabalho”, diz Bala.

Em 2024, a banda lançou seu penúltimo single até o momento. A música “Bon Appétit” saiu no dia 10 de fevereiro e hoje já tem mais de 10 mil reproduções no spotify, chegando a ser citada na quinta posição da lista de “melhores músicas de 2024” de um comentarista do sudeste asiático que diz estar ansioso para os futuros lançamentos da Excomungado.
Com músicas produzidas por D.Silvestre, produtor de Rondônia que segue em ascensão na cena musical brasileira ganhando destaque principalmente pelo funk, a Excomungado busca criar algo único dentro da música, juntando suas referências que vão do rock clássico ao funk ao brega, eles alcançam um público grande contando com mais de 4 mil ouvintes anuais no spotify, cerca 17 mil streams em suas músicas com ouvintes distribuídos pelo mundo todo, da França a Indonésia.
A Excomungado é hoje uma promessa. Com o trabalho que realizam, eles mostram que a música autoral pode florescer, mesmo em condições adversas. Com talento, criatividade e muita paixão, Carlinhos, Ícaro, Bala e Lucas transformam desafios em música, provando que o rock de Rio Branco tem voz, força e futuro.
Histórias de vida
Tonheiros: uma história servida em copos cheios
Localizado no bairro Tucumã, o Tonheiros é um dos bares mais antigos de Rio Branco ainda em funcionamento. Fundado em agosto de 1980 e hoje sob nova administração, o bar carrega o nome de seu fundador e se tornou um refúgio para gerações de universitários.

Publicado há
3 meses atrásem
27 de março de 2025por
Redação
Por Ana Flávia Santos, Camila de Souza, Clécio Nunes, José Hélio Vitalino e Luísy Rodrigues*
Localizado no bairro Tucumã, o Tonheiros é um dos bares mais antigos de Rio Branco ainda em funcionamento. Fundado em agosto de 1980 e hoje sob nova administração, o bar carrega o nome de seu fundador e se tornou um refúgio para gerações de universitários.
A proximidade com a Universidade Federal do Acre (Ufac) consolidou o espaço como um ponto de encontro para comunidade acadêmica onde debates fervorosos, romances inesperados e sonhos revolucionários se misturam ao cheiro de cerveja barata e ao som escolhido pelo público. Entre mesas gastas pelo tempo e copos sempre cheios, o local testemunhou mudanças sociais, amores nascendo e amizades se fortalecendo.
Mas o que torna esse bar memorável? Estaria o segredo apenas nas bebidas ou na atmosfera criada por seus frequentadores? O Tonheiros parece ter encontrado a fórmula ideal para atravessar gerações e seguir relevante, oferecendo um espaço de liberdade e pertencimento. O ambiente acolhedor, sua história enraizada na vida acadêmica e a capacidade de se adaptar sem perder a essência o tornam um verdadeiro patrimônio boêmio.
O legado de “Seu” Tonheiros
Aos 72 anos, Antônio dos Rios Nonato, o ‘Seu’ Tonheiros, relembra a trajetória como fundador do bar que leva seu apelido de infância. Após uma desavença com um cliente, ele decidiu fechar seu primeiro estabelecimento, localizado no bairro Volta Seca, e recomeçar os negócios no bairro Tucumã. “Aqui tudo era mato nessa época”, recorda. No entanto, ao abrir o novo bar, o movimento cresceu rapidamente e nunca mais parou.

Mesmo com décadas de sucesso, o momento mais difícil veio quando em 2013 uma cirrose hepática o forçou a se aposentar. “Eu não decidi, foi coisa do destino. Porque eu adoeci, e quando a doença vem, não vem só para mim, vem para todos”, lamenta. Apesar do desafio, ele destaca que, desde o início, sempre contou com o apoio da família e dos estudantes que frequentavam o bar.
Sem condições de continuar trabalhando, passou a administração do bar para outras duas gestões. Ramilson, um dos seus ex-funcionários, foi o primeiro. Em 2019, para o atual dono do estabelecimento, Gabriel Santos, mantendo viva a tradição do estabelecimento que marcou gerações.
Novos tempos, mesma identidade
Gabriel Santos, atual proprietário do bar, afirma que a modernização do espaço buscou equilibrar a tradição com a necessidade de adaptação. “A ideia era manter a identidade visual, manter a identidade de bar raiz e, ao mesmo tempo, modernizar alguns quesitos”, explica. Algumas das mudanças incluíram a introdução de novos produtos, a melhoria da cozinha, a promoção de eventos e a adequação do espaço para garantir mais higiene e segurança.

A modernização, no entanto, não comprometeu a essência do bar, que continua sendo um ponto de referência para universitários e moradores da cidade.
Um patrimônio afetivo da cidade
“Todo mundo sabe onde é o Tonheiros, quem nunca frequentou já ouviu falar.” A frase de Medusa Santos, estudante de Pedagogia na Ufac e frequentadora do bar há mais de dois anos, resume o lugar que se mantém como um verdadeiro marco na cidade. O bar, com sua atmosfera única, carrega as marcas de uma história que atravessa o tempo, gravada tanto nas memórias individuais quanto nas coletivas daqueles que por ali passam.
Aleta Dreves, jornalista e professora da Ufac, frequenta o bar há mais de 13 anos e comenta sobre as transformações que o lugar experimentou ao longo do tempo: “com a nova administração mudou muita coisa, principalmente a parte de cozinha que era praticamente inexistente antigamente”.
Frequentado por estudantes e moradores de Rio Branco, o Tonheiros Bar se destaca como um espaço acolhedor, tranquilo e seguro. “É um bar muito tranquilo, comparado aos outros bares de Rio Branco. Não é um bar onde a gente vê uma alta taxa de violência”, afirma Aikon Vitor, estudante da Universidade Federal e cliente assíduo. Além do ambiente pacífico, o bar é reconhecido por sua diversidade de público. “As regras que existem são de segurança mesmo, questão de briga de bar, que ele tenta sempre evitar. Esse conservadorismo a gente não tem mais”, destaca Ranna Macedo, frequentadora desde 2016.
O refúgio dos universitários
Para muitos universitários, o bar é um refúgio da rotina acadêmica intensa. “O meio universitário é muito difícil […] é muito bacana você sair de uma apresentação, sair de um TCC, de um seminário e vir aqui afogar as mágoas no Tonheiros”, compartilha Medusa Santos.
O que torna o bar memorável não é apenas a bebida ou a localização, mas a experiência coletiva que ele proporciona. “A bebida gelada, o vento, as músicas bregas, Reginaldo Rossi, as cadeiras de plástico, a galera gente boa, as pururucas… Todo o contexto dele faz esse lugar ser especial para mim. É um conjunto, né? Não é algo em si, mas cada detalhe que tem nesse bar é o que faz ele ser especial. A essência dele. É essência”, reflete Aikon Vitor.
Mais do que um bar, Tonheiros é parte da trajetória de muitos. “Foi um lugar que fez parte da minha estrada. Tenho um carinho imenso por aquele lugar”, revela Ranna Macedo, psicologa formada pela Universidade Federal do Acre. O sentimento de pertencimento vai além da nostalgia: “Quando eu chegava lá morrendo de gripe, sem conseguir respirar, e o Seu Tonheiros dizia: ‘Minha filha, aqui um remédio para você’, e me dava uma dose de cachaça com mel, de graça. E essa não foi uma experiência só minha. Os mais antigos também lembram que ele sempre fazia isso pela gente. São essas pequenas coisas que acalentam o coração”, continua ela. No fim das contas, Tonheiros Bar não é apenas um bar: é um pedaço da vida de quem passa por lá.
Ouvir para crescer
Que o Tonheiros Bar é um estabelecimento bastante reconhecido e admirado por muitos é um fato. No entanto, como em qualquer negócio que visa oferecer a melhor experiência possível, é sempre importante considerar sugestões de mudanças e melhorias vindas dos seus clientes.
“Mais opções de bebidas”, sugere o frequentador Thalisson Maya, estudante de História na Ufac.Para o discente, embora o bar já ofereça um cardápio diversificado, a inclusão de novas opções poderia ser um diferencial interessante.
“A questão do banheiro seria um ponto a se melhorar”, destaca o cliente Ruan Gabriel, também estudante de História na Ufac e mediador na escola SESI, referindo-se à necessidade de maior manutenção da limpeza ao longo da noite. Um ambiente limpo e bem cuidado é essencial para garantir o conforto dos clientes.
Outro desafio que o Tonheiros Bar enfrenta é a infraestrutura. Apesar de ser de boa qualidade, o espaço pode ser considerado limitado. “Ele é pequeno para a superlotação de pessoas, para o tanto de gente que vem aqui”, comenta Medusa Santos.
Planos para um Futuro Próximo
Para os novos e antigos clientes do Tonheiros Bar, as mudanças no espaço são uma constante, algo que o próprio Gabriel, responsável pelo estabelecimento, confirma com entusiasmo. Ao ser questionado sobre os planos futuros para o bar, ele revela novidades: “A nossa ideia é fazer um rooftop, uma laje em português bem falado, ano que vem para a galera poder apreciar melhor o pôr do sol”
Gabriel enfatiza que as mudanças visam modernizar o espaço sem jamais perder a essência do tradicional bar. “A gente pretende ampliar a área de sinuca, a gente pretende ampliar banheiros, mas sem perder a essência, claro, do nosso barzinho”, explica. Assim, com essas transformações futuras, o Tonheiros Bar promete seguir se adaptando às necessidades do público.
Texto produzido na disciplina Fundamentos de Jornalismo sob supervisão do professor Wagner Costa

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