Cotidiano
Mulheres tatuadoras no Acre e as histórias eternizadas na pele
Em Rio Branco, no Acre, esse processo já marca a cena local, com cada vez mais mulheres assumindo as máquinas, os estúdios e o protagonismo.
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2 meses atrásem
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Redação
Por Luanna Lins e Inayme Lobo
Desde muito antes de se tornar moda, a tatuagem já carregava significado em diferentes culturas. Entre povos indígenas, marcar a pele é rito de passagem, pertencimento. Em alguns países da Ásia, até hoje, ela ainda é envolta em restrições. E, quando a tatuagem moderna se espalhou, foi quase sempre dominada por homens.
Esse cenário começou a mudar quando algumas mulheres decidiram romper essa barreira. Entre as maiores inspirações estão Maud Wagner, artista circense considerada a primeira tatuadora dos Estados Unidos, no início do século XX, e Jessie Knight, que se destacou na Inglaterra a partir de 1921.
No Brasil, o mercado da tatuagem veio ganhar visibilidade a partir da segunda metade do século XX, também marcado pela predominância masculina. Nomes como Re Martelli – reconhecida como uma das primeiras tatuadoras do país – abriram caminho, tornando-se referência para outras que vieram a conquistar esse espaço.
Em Rio Branco, no Acre, esse processo já marca a cena local, com cada vez mais mulheres assumindo as máquinas, os estúdios e o protagonismo. Três delas, em especial, fazem parte dessa nova geração de tatuadoras: Ana Beatriz Tavares (20 anos), Gabriella Leão (21 anos), e Thayla Isla (26 anos). Cada uma com sua trajetória, mas unidas pela certeza de que a tatuagem é mais do que um desenho na pele, é identidade.
Experimentar, arriscar, confiar
Ana Tavares ainda era adolescente quando decidiu que a tatuagem seria sua profissão. No terceiro ano do ensino médio, ganhou um kit de tatuagem do pai e começou a improvisar peles artificiais para treinar em casa. “Eu chamei alguns colegas da minha turma pra poder fazer os primeiros treinos. Aí teve uma pessoa que aceitou e a partir disso eu comecei a tatuar”, lembra.
Aos 20 anos, Ana já possui um extenso portfólio e vem conquistando cada vez mais clientes. Foto: Inayme Lobo/A Catraia
NoO começo foi autodidata. Sem cursos presenciais disponíveis em Rio Branco, recorreu à internet. “Pesquisei cursos na internet, comecei a fazer, estudava por lá. Até o ano passado, quando participei de um workshop aqui na cidade, com um profissional da área. Então, a maior parte eu aprendi sozinha”.
Hoje, ela trabalha principalmente com o fine line e o blackwork, mas também defende as tatuagens coloridas, mesmo com pouca procura. “Muitas pessoas pensam que a cor não vai ficar tão legal depois que cicatrizar, talvez por conta do tom da pele. Mas isso é mito. As tatuagens coloridas têm contraste diferente, mas não deixam de ter a mesma qualidade”.
O que diferencia seu trabalho, segundo ela, é o incentivo ao autoral. “Normalmente, quem vem comigo, traz tatuagens já prontas, com referências da internet. Mas eu sempre indico fazer uma coisa diferente, que vai ser só pra pessoa, que ninguém vai poder copiar”.
Tavares trabalha principalmente com os estilos fine line e o blackwork. Foto: cedida
Ainda este ano, Ana abriu seu primeiro estúdio próprio, após um período tatuando em casa e em um estúdio colaborativo. Para ela, o maior desafio não vem necessariamente do fato de ser mulher, mas da competitividade no meio. “Acredito que haja ainda uma rivalidade entre os tatuadores daqui. A ideia é que é um lugar pequeno, então o público é pouco e se divide.” Ao mesmo tempo, ela reconhece que ser mulher influencia nas clientes que conquistou. “Eu confio muito no meu trabalho. Sei que dá certo porque também recebo muitas outras mulheres que querem tatuar comigo”.
No coletivo, ninguém tatua sozinha
A trajetória de Gabriella Leão (Gab Tattoo) tem um tom quase profético. “Na escola, eu falava, de forma muito despretensiosa: “ah, eu vou virar tatuadora mesmo”. Eu não sabia de nada, não tinha ido atrás de nada. E eu sempre falava isso, sabe? De uma forma espontânea. Manifestei literalmente tudo”, conta, rindo.
Gabriella encontrou na coletividade dos estúdios um espaço para crescer. Foto: cedida
Foram os amigos que abriram a porta definitiva. Ela já desenhava desde criança, influenciada pela irmã mais velha, mas foi ao conhecer Gabriel (Amaterasu), hoje colega de estúdio, que ganhou o empurrão inicial. “Ele me deu dicas de máquina, de material, de onde comprar tudo isso. Foi o pontapé que eu tava precisando”.
Depois de um mês treinando sozinha em peles artificiais, Gabriella conseguiu uma vaga de aprendiz. E ali entendeu que a vivência valia mais do que qualquer curso. “Apesar de eu estar consumindo muito conteúdo, vendo cursos gratuitos na internet, o que de fato me fez aprender foi estar ali cercada de profissionais, sempre ter o tatuador ao lado para auxiliar. Isso realmente me ajudou”.
Hoje, com um ano e sete meses de carreira, já passou por três estúdios, todos colaborativos. “Eu sempre gostei muito, porque dá pra ter uma troca de conhecimento e experiência constante. A gente tá sempre aprendendo e, consequentemente, evoluindo juntos. Eu gosto muito dessa ideia de trabalhar em equipe”.
Conhecida por Gab Tattoo, a tatuadora se destaca pelo estilo irreverente. Foto: cedida
Em relação a estilos, Gabriella não se limita, mas tem dois favoritos: o old school e o black work. “Pra mim são tatuagens que não têm erro. Tanto no quesito resultado quanto na aplicação, é muito satisfatório fazer”.
Ser mulher, para ela, também faz diferença na clientela. “Recebo muita tatuagem mais delicada, mesmo meu nicho não sendo focado nisso. Principalmente vindo de outras mulheres, em regiões mais íntimas. Acredito que, por eu ser mulher, elas se sentem mais confortáveis”.
Nesse meio, Gabriella conta que já passou por situações em que sua capacidade foi colocada em dúvida apenas por ser mulher. “Eu já passei por situações desagradáveis, como não ter voz dentro de um estúdio, duvidarem da minha capacidade sem conhecerem meu trabalho… Mas nunca deixei isso me abalar. Felizmente, o cenário da tatuagem tá mudando. Cada dia que passa vãoai surgindo mais mulheres tatuando por aqui. Eu fico feliz demais!”, resume a tatuadora.
Entre a tradição e a reinvenção
Thayla Isla (La Isla Tattoo) tinha 22 anos quando tatuou a própria pele pela primeira vez. Foi em 2021, experiência que abriu um caminho inesperado. “Desde sempre eu tive gosto por desenhar e pintar. Era um momento pessoal, no qual eu me ocupava e me encontrava. Em 2021, fiz minha primeira tatuagem e, a partir dali, passei a conhecer mais profundamente essa arte e a desenvolver uma paixão por esse universo”.
Isla atua em estúdio próprio, com clientela diversificada. Foto: cedida
O empurrão veio do colega Lean Costa, artista plástico e tatuador, que se tornou também mentor. “Ele me inspirou, me orientou e me deu todo o suporte necessário para seguir nessa caminhada que hoje é a minha vida”.
Autodidata, Isla se consolidou no old school e no tradicional americano, além de se destacar com flash tattoos em eventos. “Meu público hoje é bastante variado: atendo desde jovens até pessoas mais velhas, tanto homens quanto mulheres. Muitos clientes já chegam com o desenho pronto, mas sempre ofereço minha opinião profissional para sugerir ajustes ou melhorias desde que o cliente esteja de acordo”.
A tatuadora é especialista em old school e tradicional americano. Foto: cedida
Assim como Ana e Gabriella, também começou de forma improvisada. “As primeiras tatuagens foram feitas na casa de amigos, onde eu adaptava o espaço para trabalhar. Aos poucos, fui reunindo recursos para comprar os móveis e montar meu próprio estúdio”.
No mercado local, Isla afirma ter encontrado acolhimento. “No ramo da tatuagem no Acre, acredito que o espaço é aberto para todos. Eu, particularmente, nunca enfrentei rejeição ou cancelamento por ser mulher, pelo contrário, sempre recebi incentivo dos colegas e também muita procura de outras mulheres”, explica.
Um espaço que não para de crescer
Apesar das diferenças de trajetórias, as três tatuadoras compartilham pontos em comum. Todas vieram do desenho, todas aprenderam de forma autodidata e todas enfrentaram o desafio de conquistar credibilidade em um mercado majoritariamente masculino. Entre elas, há uma certeza: o número de mulheres tatuando está crescendo. No Acre, os estúdios de tatuagem não são mais apenas território masculino.
Na experiência delas, muitas clientes relatam que se sentem mais à vontade ao tatuar com mulheres, sobretudo em sessões que exigem expor partes do corpo. Mas o crescimento dessa procura não se explica apenas pelo conforto e acolhimento: ele também reflete a qualidade do trabalho de Ana, Gabriella, Isla, e tantas outras tatuadoras que consolidaram estilos próprios e conquistaram reconhecimento por meio de técnica e experiência.
No fim, quem procura uma tatuagem possui diferentes motivações. Há quem busque a estética, um desenho que harmonize com o corpo. Outros enxergam mais significado: homenagens, lembranças, momentos especiais. E há também quem veja na tatuagem uma forma de expressão, identidade ou simplesmente de eternizar na pele aquilo que lhe representa. Seja qual for a razão, cada tatuagem é única – assim como as histórias de quem as faz e de quem as recebe.
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Cotidiano
Da teoria à prática: o que muda quando o estudante vira professor
Publicado há
4 semanas atrásem
31 de outubro de 2025por
Redação
Por Jhenyfer Souza e Gabriel Vitorino
Conciliar a vida acadêmica com a docência, lidar com baixos salários e ainda enfrentar a falta de reconhecimento são desafios comuns para quem escolhe a carreira de professor em Rio Branco. Apesar disso, a procura por profissionais cresce e abre espaço para trajetórias que começam ainda durante a graduação. É o caso de Izabele Alves, de 21 anos, que cursa o sétimo período da licenciatura em Letras Inglês na Universidade Federal do Acre (Ufac) e já ministra aulas online.
Ela decidiu o curso por conta da afinidade com o idioma e pela admiração que tinha pelos professores. No entanto, a estudante reconhece que a visão inicial que tinha sobre o mercado de trabalho mudou ao longo da formação.
“Quando eu entrei na faculdade, eu tinha uma visão bem estereotipada do trabalho do professor. A partir do momento que comecei a procurar emprego como professora de Inglês, percebi que existe grande procura em Rio Branco”, conta Izabele Alves. Com essa experiência ela percebeu que há portas abertas na área, pois muitas pessoas querem fazer curso ou contratar um professor particular.
A estudante destaca ainda que o ensino remoto facilita a conciliação entre trabalho e graduação, mas admite que há períodos em que a carga se torna pesada. Outro ponto de atenção é a baixa remuneração, especialmente quando há vínculo com escolas particulares. Segundo ela, o acúmulo de funções é frequente.
“O professor de inglês acaba precisando assumir outras disciplinas ou preparar materiais pedagógicos. Isso acontece muito e o salário nem sempre compensa”, explica.
O cenário apontado pela graduanda dialoga com dados do Censo Escolar, que revelam a fragilidade da carreira docente no Acre. Mais de 69% dos professores da rede básica atuam com contratos temporários, chegando a 75% na rede estadual. Além disso, mesmo com nível superior, o salário-base de um professor licenciado no estado gira em torno de R$ 2,6 mil para 40 horas semanais, segundo o levantamento.
Esses números contrastam com a alta demanda da profissão. Em 2025, por exemplo, o governo abriu um processo seletivo com mais de 18 mil vagas temporárias para professores em todo o estado, sinalizando que o mercado está aquecido, mas ainda preso à instabilidade dos contratos.
Experiência
A realidade vivida por Izabele Alves dialoga com a de Renata da Silva, 30 anos, professora formada em Letras Inglês pela Ufac. Diferente da estudante, Renata começou a trabalhar durante o segundo período da graduação, experiência que tornou a transição para a vida profissional menos abrupta. Apesar disso, ela também reconhece as dificuldades da profissão. Para a professora, o maior choque está na diferença entre teoria e prática.
“Na faculdade, tudo é muito didático, até utópico. A teoria diz que o aluno vai aprender conforme o período estipulado, mas sabemos que não é assim, especialmente no Acre, onde o contato com o inglês fora da sala de aula ainda é bem restrito”, explica ela.

Renata Silva ressalta que a área segue desvalorizada, tanto pela baixa remuneração quanto pelas condições de trabalho. Segundo ela, o aprendizado do inglês exige mais do que livro e professor.
“Deveriam haver ambientes mais imersivos e ferramentas adequadas, mas muitas vezes isso não é acessível. A valorização peca e não só em questão de salário”.
Outro ponto levantado pela profissional é a concorrência com pessoas que dominam o idioma, mas não possuem formação específica. Para ela, a vivência universitária traz diferenciais que vão além da gramática e da conversação.
“A formação em Letras nos prepara para lidar com alunos neurodivergentes, com diferentes contextos familiares, além de oferecer base em fonética, linguística aplicada, educação especial. Isso faz diferença no trabalho em sala de aula”, afirma.
Apesar das dificuldades, Renata segue motivada pela interação com os alunos e pela dimensão cultural que o ensino da língua possibilita. “Ensinar inglês vai além da gramática, envolve pontos de vista, debates, diferenças. Isso enriquece a gente também”, diz.
O contraste entre as experiências de Izabele e Renata revela uma realidade marcada por dificuldades, mas também por reconhecimento e oportunidades. Esse debate é essencial quando o assunto é o mercado de trabalho, já que boa parte dos estudantes acabam sendo muito otimistas quanto às oportunidades que terão. Aqueles que já são profissionais e possuem anos de experiência percebem, cedo ou tarde, a fragilidade de sua posição no mercado.
A segurança e a estabilidade são muitas vezes varridas pela visão que as grandes e pequenas empresas têm de lucro, valorizando profissionais mais novos na área, com rotatividade maior, favorecendo o acúmulo de experiências à estabilidade financeira e a segurança no ambiente de trabalho. Com isso, muitos profissionais que se encontram no mercado há mais tempo acabam tendo dificuldade em se manterem neste contexto.
Ao se pensar na realidade do mercado de trabalho e em como as novas gerações criam expectativas profissionais, o debate acaba sendo mais profundo quando se envolve adaptação às novas referências e tecnologias que passam a interferir nas práticas, no cenário da sociedade da informação.
Vale refletir se o mercado de fato é receptivo e possui muitas oportunidades, ou se ele vê o estudante universitário como mão de obra barata de fácil acesso, mas com prazo de validade.
Cotidiano
O futuro da escrita na era digital
Entre teclados e telas, especialistas destacam que a escrita à mão ainda fortalece memória, criatividade e identidade cultural. Foto: Gabriela Queiroz
Publicado há
4 semanas atrásem
29 de outubro de 2025por
Redação
Por Maria Niélia Magalhães, Sérgio Corrêia e Gabriela Queiroz
Das cartas que cruzaram continentes aos aplicativos de mensagens instantâneas, a transição da escrita manual para a digital reflete mais do que uma evolução tecnológica — revela uma transformação profunda em como nos comunicamos, aprendemos e até mesmo como processamos informações. Enquanto especialistas debatem os impactos cognitivos e culturais dessa mudança, neurologistas, educadores e alunos avaliam os prós e contras de cada meio.
“Quando o aluno escreve à mão, ele pensa melhor no que está registrando, organiza o que é mais importante”, afirma a professora Cyndi de Oliveira Moura, 29 anos, formada em Letras pela Universidade Federal do Acre – Ufac e docente de Língua Portuguesa no ensino fundamental. Ela observa no dia a dia os efeitos da escrita manual: “alunos que anotam no caderno conseguem relembrar mais facilmente aquilo que foi explicado em sala.”
Ela destaca que a caligrafia também está ligada à criatividade, pois exige atenção e paciência. Mas nota que os estudantes atuais enfrentam dificuldades: “Eles são impacientes e querem escrever tão rápido quanto pensam. A escrita exige paciência e reflexão, mas o uso excessivo das telas acelera demais o pensamento.”
Apesar disso, a professora não vê a tecnologia como inimiga, e sim como ferramenta que precisa ser equilibrada com a escrita manual: “Os recursos digitais ampliam possibilidades, mas sem criticidade se limitam a cópias rápidas e informações superficiais. O ideal é equilibrar os dois mundos: o papel ajuda a refletir, enquanto a tecnologia prepara para o século XXI.”

Foto: Gabriela Queiroz
O advento da tecnologia digital transformou profundamente a maneira como registramos e comunicamos ideias. Se por um lado a digitação se tornou predominante pela sua praticidade e velocidade, por outro, a escrita manual resiste como prática fundamental – não por nostalgia, mas por seu impacto comprovado na cognição e no desenvolvimento cerebral.
A voz do estudante
Para Letícia Kelly, aluna do 2º ano do ensino médio de uma escola pública em Rio Branco, a escrita à mão continua sendo indispensável no seu processo de aprendizagem. “Eu prefiro escrever no caderno, porque fazer anotações melhora minha memória. Quando escrevo no celular, não consigo guardar tanto na mente”, afirma.
Elaborar pequenos textos e mapas mentais no papel facilita a memorização de detalhes importantes, segundo Kelly. “Infelizmente, as pessoas estão abandonando a escrita à mão, e isso é muito ruim, pois terão uma memória mais curta. Eu não consigo parar de escrever à mão, porque me ajuda a memorizar as coisas”, completa a estudante.

Atividade da aluna do 2º ano do Ensino Médio, Letícia Kelly. Foto: Maria Niélia
Não se trata de idealizar o passado ou desconsiderar os avanços tecnológicos. Afinal, todos nós aproveitamos a agilidade das mensagens instantâneas para nos conectar com quem está longe. No entanto, especialistas alertam: a caligrafia ativa regiões do cérebro relacionadas à memória e à criatividade de um modo que o teclado não consegue replicar.
Cenário Internacional
Pesquisas recentes confirmam que a escrita manual continua exercendo um papel fundamental no aprendizado. Um estudo norueguês, citado pela DW Brasil na reportagem Escrever à mão ajuda no aprendizado, aponta estudo, mostrou que escrever manualmente aumenta a atividade cerebral justamente nas regiões ligadas à memória e ao processamento motor e visual, favorecendo uma compreensão mais profunda e duradoura do conteúdo.
Já a BBC Brasil, em Como escrita à mão beneficia o cérebro e ganha nova chance em escolas, destaca a visão da neurocientista Claudia Aguirre, que afirma que escrever em cursivo, especialmente em comparação com digitar, ativa caminhos neurais específicos que otimizam o aprendizado e o desenvolvimento da linguagem.
A Finlândia, país reconhecido por seu sistema educacional inovador, retirou a caligrafia do currículo obrigatório em 2016, priorizando o ensino de digitação (The Guardian, 2015). Nos Estados Unidos, discussões semelhantes ganharam força nos últimos anos. Essas mudanças, no entanto, não ocorrem sem controvérsias.
À medida que escolas e estudantes se adaptam às demandas de um mundo digital, pesquisadores seguem investigando como equilibrar tradição e inovação. Por um lado, alguns educadores defendem a adaptação aos novos tempos, por outro, especialistas em neurociência e desenvolvimento cognitivo alertam para as perdas associadas à diminuição da escrita manual.
O melhor de ambos
Enquanto isso, a ciência segue confirmando: escrever à mão é muito mais que um gesto cultural – é uma ferramenta poderosa para moldar o cérebro e expandir as fronteiras do pensamento. A pergunta que permanece não é apenas sobre qual método de escrita é mais eficiente, mas como podemos integrar o melhor de ambos para promover uma aprendizagem mais rica e significativa.
Não se trata, portanto, de uma disputa entre o antigo e o moderno, mas de reconhecer que ambas as formas de escrita — a manual e a digital — podem coexistir e se complementar. Como bem ilustram a professora Cyndi e a estudante Letícia, escrever à mão continua a ser um exercício de paciência, reflexão capaz de transformar informação em conhecimento.
No fim, o que importa é lembrar: escrever não é apenas registrar palavras — é processar ideias, construir sentidos e, acima de tudo, permanecer humano em um mundo em constante transformação.
Cotidiano
Você sabia que o e-Título foi idealizado por uma acriana?
Rosana Magalhães, hoje aposentada, trabalhou na Justiça Eleitoral desde 1994. Foto: Arquivo do TRE/AC
Publicado há
1 mês atrásem
24 de outubro de 2025por
Redação
Por Francisca Samiele e Amanda Silva
Talvez pouca gente saiba, mas uma das ferramentas digitais mais importantes da Justiça Eleitoral no Brasil foi criada por uma mulher acriana. O e-Título, versão digital do título de eleitor, que ajudou a modernizar a forma como milhões de brasileiros votam, foi idealizado por Rosana Magalhães, na época, secretária de tecnologia do Tribunal Regional Eleitoral do Acre (TRE-AC).
Considerando que até 1932 as mulheres sequer tinham direito ao voto no Brasil, é irônico pensar que tenha sido justamente uma mulher a idealizar essa tecnologia, considerada essencial para o exercício da democracia ter se tornado tão prático.

A idealizadora do e-Título
Rosana Magalhães, hoje aposentada, trabalhou na Justiça Eleitoral desde 1994 e acompanhou a evolução do sistema de votação, do papel à urna eletrônica. Como analista de sistemas, ela percebeu que o título de papel era um documento que dificultava o acesso a alguns serviços da Justiça Eleitoral e a atualização de dados para muitas pessoas.
“Ele (título) não tinha foto e não tinha dados atualizados como estado civil, grau de escolaridade, nome em caso de mudança após casamento. Era um documento estático. […] Era um papel que molhava e não tinha muita durabilidade”, explicou Rosana Magalhães. A servidora comenta que foi observando essas limitações que surgiu a ideia do e-Título, um documento digital que pudesse atualizar automaticamente informações do eleitor e simplificar processos como emissão de certidão de quitação eleitoral.

“E outra coisa que observei durante toda essa minha experiência de vida na Justiça Eleitoral é a dificuldade que as pessoas tinham em atualizar seus dados e, quando perdiam o título de eleitor, ficavam numa fila enorme perto da eleição”, relembra.
O e-Título foi lançado em dezembro de 2017 e o projeto foi desenvolvido junto ao TRE-AC após aprovação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A primeira versão, desenvolvida em cerca de 40 dias, foi disponibilizada nas lojas de aplicativos e preparada para uso nacional, sendo adotado pelos estados de forma gradual.
O e-Título é acessível para pessoas com deficiência visual, baixa visibilidade ou daltônicas e também é permite acessar vários serviços, tais como:
• Apresentação de justificativa eleitoral no dia das Eleições e após o pleito;
• Consulta ao histórico de justificativas eleitorais;
• Consulta ao local de votação;
• Emissão de certidão de quitação e de crimes eleitorais;
• Geração do Título Eleitoral em formato PDF para impressão;
• Cadastrar mesária ou mesário voluntários;
• Emissão de declaração de trabalhos eleitorais;
• Geração de código de autenticação para sistemas parceiros;
• Consulta a débitos eleitorais;
• Pagamento de eventuais débitos eleitorais por Pix ou por meio da emissão de boleto.
Veja como o título de eleitor evoluiu ao longo dos anos:




Reações às mudanças
O e-Título trouxe mudanças significativas para os eleitores. Alguns se adaptaram muito bem, mas também tem quem ainda prefere o documento à moda antiga.
Para a assistente administrativa Janara Cristina Dutra Nogueira, 37 anos, a mudança é bem-vinda. “Para mim, a maior vantagem é a praticidade. Não preciso mais andar com o título de papel, ele fica no celular. Também dá para ver meu local de votação, regularizar situação eleitoral e até justificar voto se eu estiver fora”, explica.
A pedagoga Katiane Lima, também considera a mudança um bom progresso. “O aplicativo trouxe praticidade, oferecendo acesso rápido e fácil às informações, sem necessidade de buscar documentos físicos. A transição de papel para digital trouxe mudanças de mentalidade e aprendizado necessário para usar novas tecnologias”.
Mas nem todos os usuários que passaram pela transição do papel ao digital se adaptaram completamente, como é o caso da funcionária pública Iêda Fernandes, de 69 anos. “Tenho algumas dificuldades com a tecnologia… Já utilizei em alguns momentos, mas não me senti tão segura. Para utilizar como ferramenta principal, devo aprender mais sobre as funcionalidades. Preciso me tornar mais tecnológica”.
A aposentada Junisseia Souza de Lima enfatiza sua preferência pelo título em papel: “sabe por que eu não gosto de botar no telefone as coisas? Porque às vezes a gente é roubada, basta puxar o telefone para olhar e o ‘cabra’ vem e toma. A gente não fica tranquila andando com telefone, eu não fico. Então, com a cédula de votação, é melhor papel, eu gosto. Eu não gosto de sair preocupada com o telefone, então, para evitar isso, prefiro o de papel.”
Já a professora de português Gleiciany Florêncio de Araújo, de 34 anos, sugere algumas atualizações: “Para mim, uma grande melhoria no aplicativo seria se ele também pudesse ser usado offline, porque algumas vezes o sinal da internet é fraco e não dá para entrar no aplicativo”.
Progresso
A idealizadora do projeto ressalta que o e-Título continua evoluindo e pode, futuramente, incluir funcionalidades como coleta de biometria pelo próprio aplicativo.

O e-Título trouxe benefícios para os eleitores e para a Justiça Eleitoral. Agora, muitas situações podem ser resolvidas diretamente pelo aplicativo, o que diminui filas e tempo de espera. O uso digital reduz custos com impressão de títulos e certidões, e o aplicativo pode ser usado por eleitores em qualquer lugar do Brasil ou no exterior.
“O principal impacto para a sociedade, para a justiça eleitoral e para a sociedade também é a economia que teve de muitos milhões para emissão de título eleitoral, já que não há mais necessidade de imprimir”, afirma Rosana Magalhães. E ela repete uma frase que Caetano Veloso disse no dia do lançamento do e-Título: “É incrível a força que as coisas parecem ter quando elas precisam acontecer.”
Conheça um pouco da trajetória das mulheres na luta por seus direitos políticos AQUI.
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