Histórias de vida

Debaixo do pé de ingá

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Por Iza Bruna e Aline Vitória

Cruzeiro do Sul, 1984

“Era um domingo e nos dias de domingo geralmente a família ia na casa do tio Waldecir, primo do meu pai. Lá passávamos o dia com os filhos dele e os filhos do tio Antônio, irmão do tio Waldecir”.

Tio Waldecir trabalhava cuidando das criações dos padres da diocese. Eles criavam bois, galinhas e porcos. O lugar dos suínos  era uma casa coberta de telhas de Brasilit e chão de terra batida. Do lado do chiqueiro tinha um pé de ingá. Na semana anterior, o primo, filho do tio Waldecir, subiu na árvore e, no que ele foi passar da dela para o telhado, caiu e quebrou o braço.

No domingo seguinte, quando foram lá, a mãe falou: “Tu não vai subir naquele pé de ingá! ” e ela respondeu “Tá bom, mãe, não vou subir”. Chegaram, brincaram e foram atrás de pegar algumas frutas,e lá estava ele, o bendito pé de ingá, que o primo tinha caído e quebrado o braço. 

“Subi, subi e fui até a altura do telhado.Quando eu cheguei lá, fui pisar na telha. Os meninos diziam pra eu não pisar na telha, mas sim em cima de onde tivessem os preguinhos. Só que já era tarde demais. Despenquei! Foi muito rápido”, ela explica, fazendo amplos movimentos com a mão.

“Caí sentada, acredita?!?!” Machucou o tornozelo bem de leve e o punho. Caiu de uma altura de aproximadamente três metros e meio, no chiqueiro, que, por sorte, estava limpo. Ainda em choque, se tremendo de medo, pegaram no colo e chamaram a sua mãe para ir ao hospital. “Pensavam que eu tinha quebrado outra coisa, porque eu ficava puxando o pé, pois doía muito o tornozelo”, lembra.

No hospital, viram que um dos ossos do antebraço quebrou de uma forma que ficou para cima no punho, mas só fizeram um curativo e colocaram o gesso para ver se juntava. Naquela época, eles tinham o hábito de puxar o osso para tentar encaixar de volta. Puxavam, um de um lado e outro do outro, para ver se “encaixava na munheca”.

“Mas o meu não teve jeito”. Quinze dias depois ele teve que operar, colocaram pinos de platina. “Só não perdi o movimento do braço porque a minha mãe foi a minha fisioterapeuta, já que na época os médicos não eram muito diferentes de açougueiros”, comenta, achando graça.

Como não tinha muitos recursos, ela ficou seis meses com o gesso. “A mãe que tirou em casa. É uma sensação horrível… Tu fica assim, ó! ”, mostra ela, com o braço levantado e em direção ao corpo. 

Sua mãe brigava para que não ficasse na posição errada, falava para fazer certos movimentos e passava sebo de carneiro. Alguns movimentos com essa mão ela ainda hoje tem dificuldades de fazer, e mostra a mão esquerda aberta para cima em direção ao corpo, enquanto a direita fica com o movimento incompleto.

“Eu passei seis meses fazendo tudo com a mão esquerda, escrevendo, me limpando, fazendo tudo, aí virei ambidestra, uso as duas mãos pra tudo”, diz, com um sorriso satisfeito no rosto.

Hoje, quando se vê realizando suas atividades do cotidiano, se surpreende consigo mesma, “Escrevo no celular com a mão esquerda. Quando eu lavo roupa, é muito engraçado, porque eu uso as duas mãos. Me sinto super ágil!” Rimos juntas, porque é verdade, às vezes parece que ela é um polvo pela facilidade de executar várias ações com as mãos.

Essa é a história de Cariete da Costa Santiago, hoje com 47 anos, que virou ambidestra, depois de cair de um pé de ingá. Hoje ela trabalha na área da Saúde como Técnica em Enfermagem, onde já atuou no cuidado intensivo de bebês prematuros e em Home Care de idosos.

Foto: Reprodução/Rede Social

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