Saúde

Impactos da pandemia no Lar Vicentino Raimunda Odília

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Por Gercineide Maia

O Lar dos Vicentinos, Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPIS) mais antiga do Acre, fundada em 1955, apenas para homens e que atualmente abriga um total de 50 idosos (34 homens e 16 mulheres), ao longo da pandemia de Covid-19 sofreu diversos impactos entre seus colaboradores e abrigados.

Como forma de evitar a disseminação da doença o Denor (Departamento de Normatização e Orientação), órgão de assessoramento para assuntos relacionados às Unidades Vicentinas, decidiu adotar todas as medidas de segurança propostas pelos órgãos sanitários, inclusive a suspensão das visitas.

Embora os cuidados tomados, 23 idosos foram diagnosticados com Covid-19 em março de 2021, e desses, 3 chegaram a óbito devido a contaminação. Na época o surto foi informado a Secretaria de Saúde do município que diante da situação o Ministério Público (MP) acompanhou o fato e pediu que os testes fossem refeitos.

A presidente do Conselho Particular do Lar dos Vicentinos, Ana Maria Sobreira, relata que com a restrição de visitas, o contato com a família passou a ser online e para manter essa comunicação foi comprado um celular para que as pessoas idosas mantenham contato com às suas famílias por meio videochamadas. “Porém muitas vezes eles não se satisfazem em falar somente a distância”, enfatizou.

A diretora do Lar, Waldenize Rebelo explicou que que neste período de pandemia o distanciamento social tornou-se um grande desafio pois antes existiam uma presença constante da comunidade, faculdades e igrejas. “Eram realizadas atividades motoras, música, pintura, modelagem, dentre outras e com a pandemia tudo foi suspenso, inclusive a visita, a presença da família”, lamentou.

Rebelo destaca que nesse período da pandemia notaram um estresse mais alto nos idosos, aquela situação de arengar o tempo todo dentro do quarto.  “Na realidade, a pandemia machucou o emocional, por causa dessa falta da comunidade, porque boa parte deles não tem família, o carinho, a atenção que recebem é da comunidade, do estranho que se senta e ouve, que escuta, que dá uma palavra de apoio e a falta da comunidade dentro do lar nesse período de pandemia foi a parte mais difícil para eles”, destaca a diretora.

Para a diretora com esse distanciamento, a maioria das pessoas idosas que já são ansiosas e tomam medicamentos psicotrópicos para essa ansiedade, com essa falta de contato ficaram mais tristes. “Só a equipe interna não estava dando conta de assistir emocionalmente, por mais que você se entregasse, se doasse, o atendimento estava sendo insuficiente”, acrescenta.

Segundo a assistente social Alzirene Diógenes Saldanha, a pandemia afetou a todos diretamente e indiretamente em vários sentidos e isso não foi diferente para as pessoas idosas que estão institucionalizadas, que fazem parte do lar. “Elas sofrem com algumas mudanças como a questão das visitas dos parentes que só podem visitar mediante da terceira dose, conforme comprovação da carteira de vacina, uma vez que a vida dos abrigados precisa ser preservada, declara.

Mudanças ocorridas a partir da intervenção do Ministério Público

O Ministério Público do Estado do Acre (MPAC), por intermédio da Promotoria de Justiça Especializada de Defesa da Pessoa Idosa e Pessoa com Deficiência,  emitiu em fevereiro de 2021 a Recomendação Nº 001/2021/PJEDPIPCD, notificação para corrigir algumas irregularidades identificadas e melhorar a prestação de serviço no Lar

A atuação do Ministério Público do Acre (MP) foi muito importante para que houvesse melhoramentos no lar, principalmente nesse tempo de pandemia.  A antiga diretoria foi afastada e houve nomeação da atual direção, foi constatado ter documentação atrasada, e consequentemente, o lar ficou quebrado financeiramente, sem condições de pagar esses documentos, só de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) a instituição pagou 21 mil.  Para sair dessa negatividade e mostrar o que realmente o lar é para a comunidade, os Lares Vicentinos de todo Brasil se juntaram para ajudar o de Rio Branco, confirma a diretora.

Segundo relato da presidente do Conselho Particular de Rio Branco do Lar Vicentino, Ana Maria Sobreiro, desde que assumiram em março do ano passado, os cuidados com as pessoas idosas aumentaram,  se criou os protocolos, através do Ministério da Saúde todos foram vacinados com a terceira dose contra Covid-19, contra a gripe, todos os funcionários são obrigados a usar  equipamentos de proteção individual (EPI’s) como máscara, touca, luvas,  álcool em gel,  em cumprimento às orientações sanitárias.

“Hoje as pessoas idosas que vivem no Lar Vicentino têm o que merecem, que estava faltando hoje eles têm. Antes eles não tinham psicólogo, assistente social, nutricionista, fisioterapeutas e depois que assumimos, conseguimos trazer esses profissionais para o lar e para um melhor atendimento aumentamos o número de cuidadores, tudo isso solicitado pelo Ministério Público (MP)”, declara a diretora.

No início de dezembro, o Lar Vicentino Raimunda Odília abriu seu espaço para visitação para familiares e comunidade mediante agendamento e respeitando protocolo de saúde e orientações

Rotinas e atividades

Com a pandemia da Covid-19, com restrição da visitação, atividades internas foram propostas e reajustadas, seguindo protocolo.  “Tentamos, fazer festinhas de aniversário, danças, forró, criamos um cantinho para que eles se socializassem. Estas atividades juntamente com as visitas virtuais, realizadas por videochamadas, ajudaram a melhorar, principalmente, a saudade, a tensão, o nervosismo”, ressaltou a diretora Waldenize Rebelo.

No início de dezembro, o Lar Vicentino Raimunda Odília abriu seu espaço para visitação para familiares e comunidade mediante agendamento e respeitando protocolo de saúde e orientações do Departamento de Normatização e Orientação (Denor) nacional da Sociedade São Vicente de Paulo. “Mesmo abrindo as portas para a família, desde dezembro, somente 4 famílias compareceram para visitar e alguns dos familiares ainda não estão com a vacinação atualizada e isso interfere nas visitas”, conta a diretora Rebelo.

A assistente social Alzirene Saldanha pontua a importância que o vínculo familiar seja estabelecido e explicou a complexidade do assunto, pois se houvesse um vínculo familiar forte, as pessoas idosas não estariam no lar. “O fato é e pouquíssimos têm vínculo e que várias situações levam a institucionalização da pessoa idosa”, destacou.

Depoimentos dos idosos

Maria Barroso Rufino, 80 anos, natural de Boca do Acre, viúva, mãe de 4 filhos disse que quando ocorreu o número de infecção no lar não teve medo e que não sentiu nada, a não ser as pernas cansadas. “Só tenho medo daquele lá de cima”, acrescenta.

Rufino relatou que durante a quarentena, mesmo no quarto com mais duas idosas, se sentia sozinha. “Meu Deus que solidão que eu estou aqui dentro, mas Deus vai me dar força, fazer com que eu saia daqui doente eu não estou porque dizem quando bate o negócio dessa doença dá febre, fastio e eu não tive febre, bebia água, comia bem, brigava quando a comida vinha pouco. Eu falava mesmo e eu só pensava em sair de lá, pois eu me sentia presa e aí foi quando eu saí”.

João Batista Oliveira, 66 anos, solteiro, natural de Rio Branco, contou que exerceu a profissão de técnico de enfermagem em várias instituições e emocionado demostrou seu medo diante da pandemia. “Fiquei com muito medo da pandemia, muita gente pegando, então fiquei com medo de contrair a doença”, afirmou o aposentado.

Maria Geralmira Bandeira, 62 anos, natural de Senador Guiomard, viúva, professora de educação especial aposentada, mãe de dois filhos, foi uma das primeiras idosas a tomar a dose de reforço da vacina contra a Covid-19 disse que ter medo e que reza por proteção de seus parentes.

Despesas e manutenção

As despesas e custos no Lar Vicentino são diversas e exigem recursos altos para a sua manutenção e sustentabilidade.  “O idoso contribui com 70% de seu benefício e aquele idoso que não tem parente, não tem ninguém, o dinheiro, o resto dos 30% fica na casa para quando ele precisar de uma medicação, dentre outras necessidades pessoais como pintar o cabelo, fazer as unhas”, declara a presidente do Lar.

De acordo com a diretora Waldirene Rebelo, há gastos com refeições diárias, produtos de higiene e limpeza, fraldas geriátricas, remédios, energia elétrica, água mineral, internet, telefone, combustível, gás de cozinha, material para papelaria e escritório, manutenção predial e encargos como Guia da Previdência Social (GPS), folha de pagamento do salário dos funcionários, gastos com Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), dentre outros.

Rebelo destacou que o Lar Vicentino de Rio Branco Raimunda Odília é um prédio antigo e precisa ser reformado e ampliado. “Um exemplo dessa necessidade é que foi solicitado que fossem instalados chuveiros elétricos em todos os banheiros e foram instalados, porém a fiação não comporta, precisa ser mudada”.

Segundo a diretora Rebelo, a entidade é a única instituição do Brasil que não recebe Orçamento participativo do município, dinheiro que poderia ser empregado em pequenas reformas, dentre outras atividades.

Diante desse quadro, representantes do Lar Vicentino, em reunião realizada no dia 6 janeiro, expuseram a situação ao prefeito de Rio Branco Tião Bocalom que afirmou que a prefeitura não vai medir esforços para ajudar na reforma do Lar Vicentino.

A diretora disse que o lar não tem recursos financeiros para fazer essa reforma, para deixar o prédio bonito, mas que eles, enquanto instituição, capricham na higiene, na alimentação, no amor, no atendimento da saúde para que as pessoas idosas que vivem no abrigo tenham uma qualidade de vida melhor”.

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