Cultura

Biblioteca itinerante do Caquetá incentiva a leitura no interior

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Foto: Arquivo Pessoal/Maria da Conceição

“A escola pode ser uma ilha de saber e de fomento à cultura no oceano de ignorância que nos cerca.”

Por Hellen Freitas

Quantas histórias cabem sobre as rodas de um triciclo? A bibliotecária Maria da Conceição Cordeiro, popularmente conhecida como “Ceiça”, é a responsável pela Biblioteca da Escola União e Progresso, localizada na agrovila do Caquetá, em Boca do Acre. Ao invés de esperar pelas pessoas na biblioteca, ela decidiu levar as informações contidas nas prateleiras para cada leitor, por meio do projeto “Biblioteca itinerante” que visa distribuir os livros nos ramais e vilas adjacentes.

Foto: Arquivo Pessoal/Maria da Conceição

Desde menina, Ceiça descobriu nos livros a possibilidade de “viajar” para outros lugares através das linhas, estrofes e parágrafos. A bibliotecária sabe o que é não ter livros para ler, sua infância também foi em escolas rurais nas quais não havia muitos exemplares disponíveis. Por isso, ela sente a necessidade de fazer este trabalho, por compreender a dimensão e o impacto que ele tem.

“As crianças chegam na escola sem ter contato com livros, o objeto físico. As crianças não têm qualquer contato além dos livros didáticos e, por isso, o objetivo é levar o acesso à cultura letrada na fase do Ensino Fundamental 1 para o Ensino Fundamental 2” Maria da Conceição (Ceiça)

A Lei Aldir Blanc, criada para apoiar ações culturais na pandemia, também atua em aspectos sociais, como  a redução do analfabetismo na localidade. Devido ao direcionamento de indicar o livro certo para o leitor certo, mais de 70% da escola tem desenvolvido o pensamento crítico e, como consequência natural, aperfeiçoado a leitura e a escrita. Ceiça acredita que este trabalho contribui para o sucesso escolar e que a escola precisa fazer a diferença, seja no campo ou na cidade. Na vila onde mora, a bibliotecária é uma referência pelo conhecimento que carrega e pela prestatividade e solidariedade em partilhar isso com os seus vizinhos, alunos e pais de alunos. Devido a sua personalidade como educadora se sobressair, a comunidade a considera a pessoa mais “sabida” da Vila.

No clube de leitores, se destacam as meninas e seus interesses pela leitura, o que entra em contraste com a realidade na qual elas vivem. Quando ela lê para essas meninas, sente que consegue transportá-las para uma realidade melhor do que a delas. “O mundo em que elas vivem é um mundo impensável para nós, porque para elas, diferente do que a gente pensa, o Oriente Médio é aqui”, afirma a educadora, fazendo uma comparação com a situação de restrição de liberdades de parte das mulheres daquela região.

Foto: Arquivo Pessoal/Maria da Conceição

Ceiça se considera uma pessoa de comunidade rural por natureza, logo, costuma dizer que é “nascida no campo e criada no asfalto”. No ano de 2015, ela decidiu ir morar na zona rural, a fim de contribuir para a transformação na educação da região. “Eu sinto que aqui eu sou só mais uma “Ceiça”, lá eu posso fazer a diferença”. 

Há 6 anos ela direciona, auxilia e escolhe a “obra certa para o leitor certo”. Como professora e leitora, ela entende a escola como lugar de mudanças sociais. E se as pessoas não podem ir até uma biblioteca, porque não levá-la até as pessoas? A professora e bibliotecária realiza este trabalho muito antes do auxílio da lei, por acreditar que os livros são capazes de mudar a vida de alguém.

“ Depois que eles tiveram contato com os livros certos eles mudaram, porque o livro faz isso com a pessoa, né?”  Maria da Conceição (Ceiça)

Dentre os trabalhos que a educadora realiza onde mora está a busca pelo reconhecimento de alunos indígenas Jaminauás e Apurinãs no ambiente escolar. Boa parte deles possui vergonha de seus sobrenomes por não serem a maioria dos alunos na escola. Como consequência disso, eles se afastam do ambiente escolar por não encontrar representatividade. Ao perceber isso, a bibliotecária começou a trabalhar o pertencimento étnico-racial através da leitura.

Com seu triciclo, Ceiça pretende espalhar ainda mais o incentivo à leitura sobre as vielas de um ramal na pequena Agrovila do Caquetá. Como diria o poeta Mário Quintana: “O leitor que mais admiro é aquele que não chegou até a presente linha. Neste momento já interrompeu a leitura e está continuando a viagem por conta própria”. O projeto está previsto para iniciar em agosto de 2021.

Foto: Arquivo Pessoal/Maria da Conceição

Fotos: Arquivo pessoal/Maria da Conceição

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