Isolamento social fez com que orientandos, orientadores e gestores buscassem alternativas para garantir que estudantes realizassem o sonho de colar grau / Foto: Arquivo pessoal / Pâmela Freitas
Por Gabriel Vercoza Alves e Renato Menezes
Com o objetivo de reduzir os impactos da pandemia de Covid-19 na rotina universitária a comunidade acadêmica precisou se ajustar para continuar, mesmo de forma virtual, o preparo para a defesa do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). No entanto, as dificuldades para com a nova modalidade de estudo ainda causam insegurança em quem está esperando ansiosamente pelo diploma universitário.
Com a estudante do curso de Licenciatura em História, Alice Leão, não está sendo diferente. A acadêmica cursa o sétimo período da graduação na Universidade Federal do Acre (Ufac) e está tendo que lidar com ruídos externos e internos em casa que acabam atrapalhando a concentração que deseja para escrever e elaborar o TCC. “O ambiente não é propício aos estudos, tenho dificuldade de concentração e tudo acaba influenciando e dificultando ainda mais”, comenta.
Por conta da impossibilidade de ir à Ufac, ela teve que fazer pesquisas bibliográficas de forma on-line, como na Biblioteca Nacional Digital, e seguir as dicas do seu orientador Airton Chaves. Um dos medos da estudante na reta final diz respeito a instabilidade da internet que pode ser um contratempo na hora de apresentar o trabalho já que o Acre tem problemas constantes com rompimentos de fibra. “Tenho medo de não ter conexão de internet no dia da apresentação, ou até mesmo que a internet caia. Fico insegura”, diz.
SOBRECARGA
A acadêmica do 7º período do curso de Licenciatura em Letras/Libras, Katriny Almeida, também teme que problemas de instabilidade com internet seja o fator de dificuldade ao defender o TCC. O tema do trabalho dela, feito em conjunto com a estudante Adriele Costa e orientado pela professora Ivanete Cerqueira, é “A iconicidade da língua de sinais caseira de surdos do município de Porto Walter – AC”.
“Acredito que uma das maiores dificuldades tenha sido a sobrecarga com relação a outras disciplinas, assim como dificuldade de algumas vezes encontrar o momento em que a orientadora tivesse disponível e minha dupla também. Agora a preocupação é com relação a tecnologia pois sabemos que elas falham, então temos receio de faltar energia, internet ou ter algum problema técnico que prejudique a apresentação”, fala.
“FIQUEI NESSE SENTIMENTO POR MESES”
A estudante do 8º período de Jornalismo da Ufac, Pâmela Rocha de Freitas, precisou aprender a estudar no ensino remoto justamente no momento em que teve que fazer o TCC. Além disso, por diversas vezes se sentiu desanimada em ver que atrasaria seus estudos.
“No começo da pandemia eu achava que duraria um mês, estava super empolgada em formar e terminar no tempo correto. Conforme o tempo foi passando e as coisas pioraram eu entrei em uma tristeza e desânimo enormes. Não sabia quando iria me formar, não queria mais estudar. A pandemia ia me atrasar toda na faculdade – me atrasou um ano. Fiquei nesse sentimento por meses”, comenta.
Sobre as orientações, a acadêmica disse que elas foram cruciais para que a pesquisa desse prosseguimento. Orientada pela professora Francielle Modesto, seguiu um cronograma semanal que envolvia prazos. Isto, juntamente com a troca frequente de e-mails e de encontros virtuais, contribuíram para que Pâmela voltasse ao ritmo de escrita a que estava habituada antes da pandemia e desse continuidade ao TCC de tema “A ética jornalística na cobertura de um linchamento em Capixaba: um estudo sobre as notícias de caso publicadas na ContilNet Notícias e G1 Acre”, apresentado no dia 10 de junho e aprovado com média 10.
“Conversávamos por e-mail, às vezes, mais de uma vez por dia. Na verdade, tinha dias que trocávamos mais e-mails do que eu troco mensagens com minhas amigas. Sempre que surgia uma dúvida, algo que eu queria mudar, acrescentar, ou tinha visto, eu mandava para ela. E ela igualmente me mandava as coisas que ela encontrava para poder me ajudar na pesquisa. Marcamos reuniões on-line para eu apresentar o andamento da pesquisa para ela e até para ensaiar minha apresentação para a banca”, pontua.
CADA ALUNO NO PRÓPRIO RITMO
A professora Francielle Modesto foi orientadora de Pâmela e de mais dois alunos do curso de Jornalismo e disse que cada orientando escreve no próprio ritmo, principalmente durante este período onde alguns adoeceram ou tiveram parentes que foram contaminados. No entanto, organiza um plano de atividades para que a produção flua.
“Foi possível manter o suporte aos alunos e garantir o distanciamento social necessário para nos protegermos da Covid-19. Para resolver a questão da falta da biblioteca, por exemplo, eu procurei e-books, artigos, dissertações e teses, e enviei por e-mail aos alunos para que eles não ficassem sem o conteúdo necessário para pesquisar”, complementa.
ESFORÇOS
Sobre os métodos que a Ufac tem buscado para que as produções não parassem, a Pró-Reitoria de Graduação, Ednaceli Damasceno, diz que a instituição vem promovendo, desde setembro de 2020, capacitações e formações para docentes e coordenadores de curso por meio da Escola de Formação da Docência Universitária para que as atividades migrassem para o ambiente virtual, tais como reuniões de colegiado e bancas de TCC.
“Desde a suspensão das atividades presenciais, as defesas dos trabalhos de conclusão de curso estão ocorrendo de forma virtual, e nós capacitamos, junto com o Núcleo de Tecnologia da Informação (NTI), os coordenadores e alguns docentes para usar as plataformas digitais, e aí desde então esta defesa vem sendo autorizada a ocorrer de forma virtual. A Prograd também tem uma instrução normativa de nº 01, de 13 de abril de 2020, em que ela também recomenda que algumas atividades ocorram de forma virtual, e uma destas é o TCC”, diz.
A pró-reitora também ressalta que o ambiente presencial é o mais propício para desenvolver as atividades. Contudo, pontua que o momento é de cautela e de importância do resguardo da saúde dos técnicos-administrativos, docentes e alunos.
“É claro que a gente não vê o momento de retornar às atividades presenciais que é a forma como, historicamente e predominantemente, as instituições públicas de ensino utilizam em termos de modalidade de ensino. Enquanto não for possível, vamos continuar a seguir usando os meios digitais necessários para defender a saúde e a vida de toda a comunidade acadêmica”.
EM OUTROS ESTADOS
A jornalista Ariel Bentes, recém-formada pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam), foi uma das muitas estudantes brasileiras que passaram por este processo de forma totalmente remota. Intitulado “Mídia e violência contra a mulher: a abordagem jornalística do feminicídio no Portal do Holanda” o trabalho da jornalista foi estruturado, apresentado e aprovado pela banca examinadora no final de 2020 de maneira totalmente online.
Ela conta que tinha data marcada para a primeira apresentação do TCC em março de 2020, quando surgiram os primeiros casos de contaminados por Covid-19 em Manaus e a Ufam teve que suspender o semestre. Isto fez com que a jornalista tivesse mais um atraso na escrita do material que deveria ter sido entregue no segundo semestre de 2019, mas foi impossibilitada por questões pessoais.
“TRIPLA PRESSÃO”
A preparação de Ariel se tornou ainda mais difícil por alguns problemas envolvendo tecnologia, pressão psicológica, saúde mental e produtividade em um momento atípico. “O processo de produzir um trabalho de conclusão de curso já é muito complicado, já existe uma pressão no meio disso e para mim houve ainda mais pois tinha tentado fazer essa entrega em 2019, não consegui finalizar e estava fazendo essa segunda tentativa em 2020. Me sentia com uma tripla pressão”.
Para se preparar da forma como gostaria, ela pediu demissão do emprego, passou a fazer trabalhos freelancers na área e começou uma rotina de estudos que demandava tempo de pesquisa e inúmeras trocas de mensagens e e-mails com a orientadora Ivânia Vieira.
Apesar do nervosismo, o fato de ter apresentado o TCC de forma online a deixou mais tranquila no sentido de não ter que ficar “cara a cara” com a banca. Porém, não considerou fácil a experiência de ter que produzir em plena pandemia. “Uns três dias antes de fazer a defesa houve um falecimento na família de um tio meu por infarto fulminante, então fiquei bem abalada, mas fui bem instruída pela minha orientadora de como fazê-la online”.