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A vida de quem sai de casa para estudar

Longe da família, alunos de municípios do interior encaram os desafios de permanecer no ensino superior

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Por Yana Vitória

Conquistar uma vaga em uma universidade pública representa, para muitos jovens do interior, somente o primeiro passo de um desafio ainda maior. Após vencer o Enem, começa a batalha pela permanência: deixar a casa da família, mudar-se para a capital ou para um município próximo e enfrentar o peso financeiro, emocional e social de um projeto de vida que, muitas vezes, depende do apoio de políticas públicas para não ser interrompido.

Na Universidade Federal do Acre (Ufac), essa realidade é vivida principalmente pelos estudantes vindos do interior, que precisam buscar em Rio Branco e Cruzeiro do Sul cursos inexistentes em suas cidades de origem. A política de assistência estudantil tenta amenizar essas dificuldades, mas enfrenta limitações para garantir condições adequadas a todos.

A precariedade do transporte público, a distância das zonas rurais e a ausência de políticas que atendam plenamente esses alunos deixam muitos em situação de vulnerabilidade. Há quem passe o dia inteiro fora de casa para assistir a poucas horas de aula. Outros, sem conseguir arcar com o custo das passagens, acabam prejudicando sua frequência. E há ainda quem precise deixar sua cidade, o emprego e a família para tentar a sorte na capital, muitas vezes sem o apoio necessário para se manter.

“A gente sabe que não consegue alcançar todo mundo que precisa”, reconhece Cydia de Menezes Furtado, diretora de Apoio Estudantil da Ufac. Segundo ela, a universidade atua com recursos do Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), cuja maior parte — entre 60% e 65% — é destinada à manutenção dos Restaurantes Universitários (RUs). O restante se divide entre bolsas e auxílios, conforme o número de estudantes de cada campus. “Tentamos contemplar o maior número possível de estudantes, mas há limites impostos pelo orçamento”, explica.

Apoios e limites

Entre os principais auxílios estão o auxílio moradia, voltado a quem vive longe da família, e o auxílio-transporte intermunicipal, destinado a estudantes de cidades próximas, como Bujari, Porto Acre e Senador Guiomard. Além deles, o passe estudantil garante acesso ao transporte urbano em Rio Branco.

Em Cruzeiro do Sul, a Ufac mantém uma residência estudantil com 26 vagas, destinada a alunos em situação de vulnerabilidade. O espaço oferece moradia, bolsa mensal, transporte, refeições gratuitas no RU e suporte social e psicológico.

Na capital, entretanto, a iniciativa não foi replicada, com a justificativa de que manter uma residência estudantil exige boa estrutura, equipe e orçamento. “A universidade passa a ser responsável pelos moradores, incluindo alimentação e acompanhamento social. Por isso, em Rio Branco, optamos por conceder o auxílio moradia em dinheiro, uma alternativa mais viável dentro da nossa realidade orçamentária”, afirma Cydia Furtado.

Ainda assim, a diretora admite haver uma cobrança constante dos alunos para que a Ufac também ofereça moradia na capital, onde a demanda é muito maior.

Luta pela permanência

A busca por oportunidades em Rio Branco exige dos estudantes mais do que adaptação. Requer estratégias de sobrevivência. A trajetória de Sandy Andrade, estudante de Engenharia Florestal, retrata bem essa realidade. Natural de uma comunidade rural de Boca do Acre, ela precisou se mudar para a capital ainda no ensino médio, diante da falta de oferta educacional em sua cidade.

“Tive que correr atrás. Morei com parentes, depois fui para apartamento, sempre tentando me manter. Trabalhei, procurei estágio, vendi produtos. O custo de vida aqui é alto. Os auxílios ajudam, já fui contemplada algumas vezes e pude contar com o valor da bolsa para o aluguel, além de fazer minhas refeições no RU. Mas é preciso coragem para enfrentar tudo isso. E quem não tem família em Rio Branco sente ainda mais”, relata Sandy.

O relato de Sandy, assim como o de tantos outros estudantes, reflete um cotidiano onde a permanência universitária está ligada à luta diária. Histórias de jovens que vendem doces, fazem trabalhos informais ou dependem de familiares para conseguir continuar estudando são comuns e revelam que, apesar dos esforços institucionais, a assistência ainda não supre as reais necessidades.

Embora garantido por lei, o apoio estudantil depende diretamente dos repasses federais. A Ufac participa de fóruns nacionais e reforça a necessidade de revisão da matriz orçamentária, especialmente para as regiões norte e nordeste, onde os índices de vulnerabilidade social são mais elevados.

Além das bolsas e auxílios, a universidade mantém estágios remunerados e busca alternativas para evitar a evasão, apostando em ações que garantam a permanência e a conclusão dos cursos.

Entre o esforço diário, o cansaço e a resistência, estudantes do interior seguem buscando formas de permanecer na universidade, enfrentando as incertezas de um sistema que ainda não consegue garantir segurança a quem deixou sua terra natal em busca de um futuro melhor.

Redação

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