Conheça a vida e a história das docentes que percorrem os corredores da universidade
Por Beatriz Mendonça e Victor Manoel
O papel das mulheres na sociedade, por séculos, foi diminuído ao trabalho doméstico. A realidade começou a mudar por volta do século XVIII, em função da Revolução Industrial, em que as mulheres começaram a trabalhar fora de casa, porém em situação precária e com salários menores em relação ao dos homens. Os séculos seguintes são marcados por mais transformações, como a difusão dos movimentos sociais e feministas, além da ocorrência das duas Guerras Mundiais, que levaram ainda mais mulheres ao mercado de trabalho.
A inserção do sexo feminino no mercado foi um pontapé para a emancipação feminina que seria observada nas décadas seguintes, com a conquista de direitos inéditos, como de voto, de possuir independência financeira, de salários mais justos e até mesmo de estudar. No ambiente universitário, apesar dos muitos obstáculos, elas ocupam um espaço cada vez mais importante.
“Escolher a docência universitária foi uma decisão motivada pelo desejo de transformar vidas por meio da educação. Sempre acreditei que o ensino superior tem um papel fundamental na construção de uma sociedade mais justa e igualitária”, quem fala é a doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP), graduada em Direito, em Administração e em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo e professora do curso de bacharelado em Jornalismo da Universidade Federal do Acre (Ufac), Luci Teston.
Foto: Luci Teston é professora e coordenadora de diversos projetos dentro do campus. Créditos: Diário do Acre
Teston revela que ao entrar no ambiente acadêmico, apesar das oportunidades, percebeu os desafios estruturais para as mulheres neste meio.
“Além disto, as políticas públicas dos últimos 15 anos trouxeram tanto avanços quanto retrocessos, afetando diretamente o ensino, a pesquisa e a extensão. Mesmo com um número crescente de professoras e pesquisadoras, a equidade de gênero ainda não foi plenamente alcançada”, afirma a docente.
Conquista de espaços
De acordo com o Censo Escolar de 2022, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), as mulheres são maioria na educação infantil, sendo 97,2% nas creches e 94,2% na pré-escola, e elas continuam liderando até o ensino médio com 57,5%. Porém, quando se fala da docência na educação superior, os homens que lideram com 52,98%.
“A presença feminina em cargos de liderança acadêmica tende a ser menor, o financiamento para pesquisas lideradas por mulheres ainda é limitado e o impacto da maternidade na carreira continua sendo um fator importante”, reflete Luci Teston sobre a presença feminina em cargos superiores.
Foto: campus de Rio Branco da Universidade Federal do Acre. Créditos: Reprodução
No livro “Mulher na Educação: a paixão pelo possível”, a autora Jane Soares de Almeida salienta que a história de mulheres como professoras no Brasil ocorreu tanto devido às lutas feministas quanto pela saída dos homens dessa área pelos baixos salários. Além disso, para as moças solteiras que precisavam de um meio de sustento, essa era uma alternativa por ser uma representação da função das mulheres da época, instruir e educar crianças.
Fazer a diferença
A profissão ainda reflete muito das noções de identidade de gênero, e os números que apontam as mulheres como maioria em educação infantil mas minoria na docência em universidades espelham o estereótipo inicial das mulheres como responsáveis pelo cuidado das crianças.
“O financiamento para pesquisas lideradas por mulheres ainda é limitado e o impacto da maternidade na carreira continua sendo um fator importante”
Luci teston
“Apesar dos desafios, sigo acreditando no poder da educação como ferramenta de transformação. Para que a universidade continue cumprindo seu papel social, é necessário que haja investimento contínuo no ensino, na pesquisa e na extensão, além de um compromisso consistente com a equidade de gênero. Somente assim poderemos garantir que a universidade seja um espaço verdadeiramente inclusivo e capaz de formar cidadãos críticos e comprometidos com a sociedade”, finaliza Luci Teston.
A professora do curso de Biologia da Ufac, Eliete Sousa, trabalha desde 2017 na instituição e relata: “Eu decidi cursar Biologia para ser bióloga, nunca quis ser professora. Durante a graduação passei a ter contato com as professoras do curso e fui me interessando”.
Após terminar sua graduação e fazer mestrado e doutorado, ela ainda atuou como professora em faculdades privadas por quatro anos. Por ter sido um período difícil, diz como é gratificante poder trabalhar sendo concursada pela Ufac, onde além de trabalhar com o ensino também pode desenvolver projetos na área da pesquisa.
Foto: Eliete Souza, professora desde 2017 no campus. Créditos: Cedida
Para Eliete, sua trajetória até a docência foi simples, seu maior desafio mesmo foi conciliar a carreira com as tarefas domésticas. Apesar da ajuda do parceiro, as maiores responsabilidades, principalmente com os filhos, ficavam nas mãos dela. Uma realidade que é possível ser observada na maioria das mulheres que estão no mercado de trabalho hoje em dia.
Relembrar e celebrar
No dia das mulheres, é importante olhar para as diversas perspectivas que existem dentro desse universo do gênero feminino. Ao considerar a jornada das mulheres que se tornaram professoras na Universidade Federal, é possível fazer pontos de conexão com a jornada e vivência de milhares de outras que conquistaram seu espaço no mercado de trabalho, tanto em profissões populares como em outras áreas que geralmente são dominadas pelos homens.
“Apesar dos desafios, sigo acreditando no poder da educação como ferramenta de transformação”
Luci Teston
É necessário celebrar suas vitórias, mas também relembrar desafios, considerar antecedentes das adversidades que são vividas até hoje, observar o contexto social que cada cenário se insere. Enfim, olhar o caminho que foi percorrido mas também contemplar os próximos passos a serem dados.