Cotidiano

Táxi compartilhado: o transporte da pandemia

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Foto: Reprodução/Jornal O Nortão

Por Ycla Araújo

Os meios de transporte públicos ficaram comprometidos com o início da pandemia, em março de 2020, atrapalhando a vida de alguns trabalhadores que não deixaram de exercer suas funções. Para muitos, o risco de perder o emprego por conta dos atrasos dos ônibus era algo constante no dia-a-dia e o cansaço de acordar cada vez mais cedo para não perder a hora virou rotina. 

No bairro Cidade do Povo, um dos residenciais mais distantes do Centro, um problema que os moradores ainda enfrentam é a demora e atrasos da frota dos coletivos públicos. Outra questão é a falta de segurança. Com assaltos e sequestros aos ônibus, a população passou a zelar cada vez mais pelo próprio bem-estar. 

CARROS COMPARTILHADOS 

Uma solução adotada em alguns bairros foi o “táxi compartilhado” ou “carro compartilhado”, que faz viagens do bairro ao Centro, ou vice-versa. Apesar do preço mais alto do que os ônibus, muitos fazem questão de pagar e consideram extremamente eficiente, levando em conta a demora dos coletivos. A ideia foi adaptada dos que já rodavam fazendo esse serviço entre municípios e inspirada em outros Estados brasileiros.  O objetivo é ter um meio de transporte barato, seguro e confortável. 

Quem trouxe a proposta de alternativa do transporte para a cidade foram os taxistas José Júnior e Esperidião Teixeira, em julho de 2019. Porém, apenas com o início da pandemia que as corridas e a aprovação do público teve crescimento. Atualmente, segundo levantamento do Sindicato dos Taxistas e Condutores Autônomos do Acre, cerca de 7 mil pessoas fazem uso deste serviço diariamente em toda Rio Branco e a perspectiva é de crescer cada vez mais. 

Segundo Esperidião Teixeira, presidente do Sindicato dos Taxistas, eles juntaram no início 150 taxistas, abrindo seis linhas principais de rota, hoje ampliadas para oito. “Temos a proposta de criar um aplicativo, que facilite e atenda melhor tanto o motorista como o passageiro. Pretendemos melhorar muito, só nos falta a regulamentação da prefeitura”, relata. 

A solução também veio em boa hora para os motoristas, que vinham enfrentando dificuldades desde a chegada do Uber e outros aplicativos na cidade. “A nossa situação melhorou e muito. Antes fazíamos uma média de quarenta reais, hoje voltamos com duzentos reais. Não sobra muito, mas é o suficiente pra pagar as contas, manutenção do carro e gasolina”, diz José Júnior, motorista.  

Estacionamento no Centro da Cidade de Rio Branco. Foto: Ycla Araújo.

VALORES E CRISES 

As linhas Cidade do Povo e Vila Acre sofreram um ajuste recentemente, considerando que são os bairros mais distantes do Centro. Inicialmente, o valor cobrado era de cinco reais, porém, com os atuais aumentos no combustível, a categoria se viu obrigada a aumentar o preço para seis reais. Os demais bairros sofrerão o reajuste a partir de outubro. “Quando nós iniciamos a gasolina estava R$ 4,75, ainda dava um lucro de 25 centavos. No preço de hoje não dá mais. Por R$ 6,00 ainda não é o suficiente, mas dá de levar e a população entendeu. Fizemos uma pesquisa antes para entender e todos acolheram”, diz Junior. 

Uma crise que o Sindicato enfrenta é a perseguição das empresas de ônibus, do RBTrans e a demora da regulamentação por parte da prefeitura. A luta atual é que eles possam ser reconhecidos legalmente perante o município e a população em geral. “A prefeitura no início foi contra, por achar que iríamos disputar com os ônibus. Mas cabe à população escolher a forma de transporte melhor para ela. A ideia não é competir com o transporte público ou outras categorias, é ser apenas mais uma opção. Um meio seguro, prático e rápido”, informa o presidente do Sindicato. 

No fim de julho, foi realizada uma reunião com o prefeito da cidade, Tião Bocalom, para resolver a questão da regularização, juntamente com a RBTrans e o Sindicato dos Taxistas. O momento é de grande expectativa para os mais de 150 motoristas. “Após uma reunião feliz, podemos regularizar não somente os taxistas que trabalham com o serviço de lotação, mas também outras categorias”, informa Anízio Alcântara, representante da RBTrans. 

No início de julho, a frota de ônibus aumentou na capital. Atualmente estão em circulação 60 ônibus, um número bem maior se comparado ao início da pandemia. O momento traz um pouco de desânimo aos motoristas, que perceberam uma certa queda de pedidos, mas eles seguem confiantes, já que muitos passageiros se acostumaram ao conforto e praticidade do transporte compartilhado. 

José Junior – motorista. Foto: Ycla Araújo.

COMUNICAÇÃO 

Os motoristas criaram praticidade com os grupos no WhatsApp para atender a população. Atualmente são oito bairros com o serviço de transporte compartilhado, cada bairro tem em média dez grupos com 250 pessoas. Para atender todo mundo de forma justa, os motoristas decoram quem pediu primeiro, seguindo a ordem de chegada. A comunicação entre os vários motoristas é através do aplicativo Zello, que funciona como um rádio. Cada bairro tem sua linha, sem interferir nas demais. 

O presidente do Sindicato, Esperidião Teixeira, conta que a intenção é ter um contato de amizade com o passageiro, onde ele se sinta seguro e confortável no ambiente.  “Em um ônibus muitas vezes você entra e não recebe nem um ‘bom dia’. Mas o taxista vai está próximo de você, ao seu lado, você cria uma relação. Já tivemos casos de levar mulheres em trabalho de parto e fazemos entrega de sacolão quando sabemos que tem alguém com necessidades”, explica ele. 

Esperidião Teixeira, Presidente do Sindicato. Foto: Ycla Araújo.

MULHERES MOTORISTAS 

Atualmente existem oito mulheres taxistas vinculadas ao Sindicato. Muitas começaram por influência dos amigos ou do marido. O presidente do Sindicato reforça que buscam ser atentos para casos de machismo contra as profissionais. Ele conta que no início só tinha um banheiro, que era usado pelos homens. Quando entrou a primeira mulher e ela perguntou onde era o banheiro feminino é que ele percebeu que iriam precisar e logo mandou fazer um para as mulheres também. “Estamos nos adaptando. A regra aqui é clara: a convivência é igual, independente do sexo, eles não estão nem doidos em distratar uma mulher.”

Elissandra Santiago relembra que pensou em fazer o curso de taxista para ter uma segunda opção de emprego, caso algo acontecesse. “Eu e meu marido pensamos em fazer o curso de táxi no caso de ele adoecer, poder trabalhar com outra coisa mais prática. Eu já tinha o curso e meu carro, então, comecei como motorista auxiliar e gostei.” 

Sobre a aceitação com colegas de trabalho e clientes, ela conta que nunca passou problemas com os colegas de profissão e que muitos passageiros se sentem até mais seguros em ter como motorista uma mulher. Para ela, os colegas de trabalho também consideram que a mulher é mais atenciosa no trânsito.

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